P / INFO: Crónicas, & Capela do Rato, Inscrições
para as celebrações
Frei Bento: Deus não é um rival
Pe. Anselmo: O Papa Francisco confessa-se. 1
Cardeal Tolentino: Lidar com a repetição p 167
Pe. Vítor Gonçalves: Esperar é sair ao encontro
NOTA: O site da Capela do Rato ainda não foi actualizado.
Sugiro uma ida a: https://www.capeladorato.org/ para ter dados novos
DEUS NÃO É UM RIVAL
Frei
Bento Domingues, O.P.
Devia ser esta a convicção da religião que recusa
qualquer espiritualidade que despreza
o mundo em nome de Deus.
1. A Humanidade de Deus[1] é o título do
primeiro volume que reúne algumas das minhas primeiras crónicas no Público. Por razões de trabalho, tive de
revisitar a introdução que escrevi para a essa minha colectânea. Hoje,
parece-me que foi a procura de fidelidade, à significação implicada na escolha
desse título, que explica a alegria que encontro nos gestos e textos do Papa
Francisco e dos quais tenho procurado dar testemunho em algumas crónicas dos
últimos anos.
Encontrei,
nessa introdução, a referência a um acontecimento dos agitados anos 50 do
século passado, que provocou em mim, para sempre, o desassossego teológico.
Eram anos em que se consumava a repressão das
vozes livres na Igreja, retomada nos finais do século 19 e na primeira metade do
século XX. Esse acontecimento, aparentemente banal, foi para mim o encontro com
um texto dos anos 30, recomendado por Paul Denis, um professor que buscava as
fontes dos rios filosóficos e teológicos a partir da sua foz, o mundo
contemporâneo.
Em 1935, pediram a Yves Congar O.P. para
comentar os resultados alarmantes de um Inquérito realizado pela famosa revista
La Vie Intelectuelle, sobre as
“razões da descrença actual”!
Depois
de analisar o longo processo de divórcio entre a Igreja e os movimentos
científicos, culturais e sociais, que agitaram a gestação do mundo moderno,
sintetizou-o numa expressão que me marcou: «a uma religião sem mundo, sucedeu
um mundo sem religião».
Trinta
anos mais tarde, em pleno Vaticano II, voltou a insistir no mesmo ponto: «o
maior obstáculo que os seres humanos de hoje encontram no caminho da fé vem da
falta de ligação que julgam verificar entre, por um lado, a fé em Deus e, por
outro, o ser humano e a sua obra terrestre. É urgente mostrar o laço íntimo que
os une. É na superação desse fosso que se deveria procurar a resposta mais
eficaz às razões da descrença moderna»[2].
O
célebre jesuíta, Teilhard de Chardin, numa breve nota, de 1920, sobre a
evangelização dos novos tempos, já pressentia a gravidade do que estava a acontecer:
«Cristão e humano tendem cada vez mais a não coincidir. É este o grande cisma
que ameaça a Igreja».
Na
mesma introdução, cito o grande medievalista dominicano, Marie-Dominique Chenu,
que, sempre atento aos sinais dos tempos, continuava a verificar, em 1960, que
«o novo mundo dos nossos dias ainda não tinha sido integrado no pensamento
cristão».
Philippe
Roqueplo, na sua tese de doutoramento, Experience
du monde: Experience de Dieu?[3] –,
ao percorrer o monumental Dictionnaire de
Théologie Catholique (publicado entre 1904 e 1950, em 22 grandes volumes) verificou
que a teologia oficial se tornara impermeável a todas as tentativas de assumir,
na experiência cristã, a construção do
mundo.
Foram
os considerados teólogos heterodoxos,
acolhidos por João XXIII que, no
Vaticano II, tentaram iniciar, de modo oficial, a superação desse divórcio. Outros,
depois, procuraram fazer esquecer esse começo de revolução. Bergoglio, na linha
do Cântico das Criaturas de Francisco
de Assis, tem procurado retomar, concretizar e alargar a linha mais luminosa do
Vaticano II e da Pacem in Terris,
para eliminar os instrumentos do supremo terror.
2. O primeiríssimo
capítulo que abre a Bíblia, na sua organização actual (Génesis, 1-2), é um
poema que apresenta Deus a dizer, de forma extasiada: Que o mundo seja! Não é um Deus preocupado com o seu prestígio, com
o seu ego, mas com a afirmação do outro, do diferente e criativo em face da
divindade. Deus não se manifesta aí a querer ser tudo. A ideia de ver em Deus
um rival do ser humano é uma megalomania diabólica. Deus não quer reservar para
si os segredos, os enigmas do universo. Investigá-los é tarefa humana.
Devia
ser esta a convicção da religião que recusa qualquer espiritualidade que
despreza o mundo em nome de Deus; que fecha os olhos para a beleza e para os
enigmas do cosmos, para o calor do amor humano, para a importância da criação
artística, para o valor da investigação cientifica, para os trabalhos de ganhar
o pão com o suor do próprio rosto, para a competência em socorrer as vítimas
das doenças, para os problemas grandes ou pequenos de governar uma casa ou um
país num mundo cada vez mais globalizado.
3. J. P. Audet, em
1966, no contexto das discussões em torno do sagrado, do religioso e da fé
judaico-cristã, publicou um importante estudo sobre “a vingança de Prometeu ou
o drama da religião e da cultura”[4]. Procura
mostrar que, na Bíblia, não se encontra o equivalente do mito de Prometeu, tal
como este vem apresentado em Hesíodo e Ésquilo: os deuses escondem aos homens o
segredo da vida feliz. Aquilo de que os homens precisam para fazer a sua vida,
por sua conta e risco, o fogo (ciências e técnicas) tem de ser arrancado aos
deuses contra a sua vontade, como o fez Prometeu. Deuses e homens são rivais.
A
felicidade dos deuses é a desgraça dos seres humanos e a felicidade destes é um
roubo aos deuses. Nada disto existe na Bíblia. Aí, a
terra é dada ao homem e à mulher para que façam dela a sua morada[5]. A
pastorícia, a agricultura, a música, as técnicas, os negócios, as ciências e a
sabedoria não são roubos a Deus, são acontecimentos humanos normalíssimos[6]. Não,
porém, o trabalho escravizante[7],
fruto de um ser humano que, quando se desorienta, desorienta as dimensões todas
da vida e esquece que os outros são seus irmãos[8].
A
tese de Audet não consiste apenas na contraposição do mito grego da rivalidade
entre deuses e homens e o universo bíblico, em que Deus é princípio de
gratuidade, de dom, e a religião da sabedoria, em Israel, uma percepção
admirativa do divino.
Isto
representa apenas o espaço para abrir uma outra perspectiva: a ideologia da
“consagração do mundo” não deve merecer cobertura teológica porque não tem
cobertura bíblica.
A
relação religiosa co-habita, sem medo nem remorso, com o profano. O religioso
pode ser espaço do profano e o profano, espaço do religioso. O sagrado, “o
reservado para Deus”, é apenas o reservado para uma das mediações da religião,
a mediação ritual.
O
sagrado e o religioso não são co-extensivos. Tudo o que é percebido como sagrado
(separado) tem a ver com a religião, mas nem tudo o que tem a ver com a
religião tem a ver com esse sagrado. A percepção religiosa supera e enquadra,
diferentemente, o sagrado e o profano. A mediação ritual tende a fechar o
fenómeno religioso no seu espaço.
Daqui o perigo das preocupações com a “consagração do mundo”.
Esta, sem se dar conta, consagra a perspectiva prometaica das relações entre
religião e cultura. Parece beneficiar a religião, mas a religião só pode
esperar pela vingança. Reencontramo-nos, assim, com o diagnóstico de Yves
Congar, nos anos 30: a uma religião sem
mundo, sucedeu um mundo sem religião.
in Público
08.11.2020
https://www.publico.pt/2020/11/08/opiniao/opiniao/deus-nao-rival-1938169
[1] Edição de Mário Figueirinhas, Porto
1994 – as crónicas são de 1992-1993
[2] Chrétiens en dialogue, Paris, Cerf 1964, p. XXXIII.
[3] Cerf, Paris 1968.
[4] La revanche de Promété ou le
drame de la religion et de la culture, in Rev.
Biblique, 73 (1966), 5-29
[5] Gn 1,28; Sl
8,9-14; 115,16
[6] Gn 4,19-22;
1Rs 5,9-14
[7] Gn 3,17
[8] Cerf, Paris 1968.
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O
Papa Francisco confessa-se. 1
Anselmo
Borges
Padre
e Professor de Filosofia
1.
Francisco é o Papa que mais entrevistas deu. É claro que, ao conceder
entrevistas a grandes meios de comunicação social mundiais, acaba por falar
mais directa e espontaneamente de temas que nem sequer apareceriam se se
mantivesse nos pronunciamentos formais de homilias e documentos oficiais. De
facto, os jornalistas são curiosos e fazem perguntas que o grande público
também gostaria de fazer.
Acaba
de ser este o caso com uma longa entrevista concedida ao director da agência
italiana AdnKronos, Gian Marco Chiocci. Concedida na sequência e no contexto da
destituição do cardeal Angelo Becciu, acusado de ter desviado fundos
normalmente destinados aos pobres, para beneficiar a sua família, Francisco
declara que a corrupção é “um mal antigo que se transmite e se transforma nos
séculos”. Na Igreja, “a corrupção é uma história cíclica, repete-se, depois vem
alguém que limpa e põe em ordem, mas depois recomeça-se, na expectativa que
chegue outro para pôr fim a esta degeneração.” Numa Igreja para os pobres, mais
missionária, não há lugar para quem enriquece e faz enriquecer o seu círculo,
vestindo indignamente a batina. “A Igreja é e permanece forte, mas o tema da
corrupção é um problema profundo, que se perde nos séculos. No início do meu
pontificado fui ao encontro de Bento XVI. Ao passar-me a ‘pasta’, entregou-me
uma caixa grande, dizendo: ‘Está tudo aí dentro, estão os procedimentos com as
situações mais difíceis, eu cheguei até aqui, afastei estas pessoas, e agora...
cabe a ti.’ E eu não fiz mais do que recolher o testemunho do Papa Bento,
continuei a sua obra.”
Neste
contexto, e querendo desfazer dúvidas e insinuações, Francisco refere-se ao
antecessor como “um pai e um irmão, escrevo-lhe por carta ‘filialmente e
fraternalmente’. Vou ao seu encontro muitas vezes; se ultimamente o vejo menos
é porque não quero cansá-lo. A relação é verdadeiramente boa, muito boa,
concordamos sobre o que deve ser feito. Bento é um homem bom, é a santidade
feita pessoa. Entre nós não há problemas, depois cada um pode dizer e pensar o
que quiser. Pense nisto: até chegaram a dizer que tínhamos discutido, eu e
Bento, sobre que túmulo cabia a mim e qual a ele.”
De
volta à corrupção, refere o famoso bispo Santo Ambrósio: “A Igreja foi sempre
uma ‘casta meretrix’, uma casta meretriz, uma pecadora. Melhor: uma parte dela,
porque a grande maioria vai no sentido contrário, segue no caminho justo. Mas é
inegável que personagens de vários géneros e importância, eclesiásticos e
tantos leigos amigos fingidos da Igreja contribuíram para dissipar o património
móvel e imóvel, não do Vaticano, mas dos fiéis.”
A situação
quanto à opacidade da gestão das finanças do Vaticano, ao óbolo de São Pedro, à
imprudência de certos investimentos, às actividades pouco caritativas de alguns
pastores é mais grave do que suporia. Para “extirpar a erva daninha da
corrupção não há estratégias particulares, o esquema é banal, simples, andar em
frente e não parar, é preciso dar passos pequenos, mas concretos. Para chegar
aos resultados de hoje partimos de uma reunião realizada há cinco anos sobre
como actualizar o sistema judicial, depois com as primeiras investigações tive
de remover posições e resistências, escavou-se nas finanças, tivemos novos
directores no IOR (Instituto para as Obras de Religião, normalmente conhecido
como Banco do Vaticano), numa palavra, tive de mudar muitas coisas, e muitas
rapidamente vão mudar.”
E
aparece a avó a dar bons conselhos: “Ela, que não era teóloga, dizia-nos
sempre, quando éramos crianças: o diabo entra pelos bolsos. Tinha razão”.
E
certamente não será inocentemente que Francisco venha lembrar a história da
velhinha que encontrou numa imensa favela de Buenos Aires no dia em que João
Paulo II morreu. Na Missa, rezou pelo Papa defunto. “Terminada a celebração,
aproximou-se uma mulher muito, muito pobre, queria saber como é que se elege o
Papa, falei-lhe do fumo branco, dos cardeais, do conclave. Ela interrompeu-me e
disse: ouça, Bergoglio, quando for Papa, lembre-se de que a primeira coisa que
tem que fazer é comprar um cãozinho. Respondi-lhe que dificilmente seria eleito
Papa, mas, mesmo assim, perguntei-lhe porque é que devia arranjar um cão.
‘Porque sempre que vá comer, respondeu, dê-lhe primeiro um bocadinho e, se ele
continuar bem, então continue o senhor também a comer.” O que é que levou
Francisco a contar a história? É assim que está o Vaticano? Francisco
imediatamente: “Tratava-se obviamente de um exagero. Mas exprimia a ideia que o
Povo de Deus, os pobres entre os mais pobres no mundo, tinha da Casa do Senhor
atravessada por feridas profundas, lutas intestinas, desfalques.” Terá sido só
por simplicidade e porque gosta de estar com as pessoas que Francisco não quis
ficar no Palácio Apostólico, preferindo vir para Santa Marta?
O
Papa Francisco terá medo? A resposta desta vez é mais ponderada, confessa o
jornalista, o silêncio parece nunca mais ter fim, parece que à espera de
encontrar as palavras justas. “E porque havia de ter?”, pergunta. “Não temo
consequências contra mim, não temo nada, ajo em nome e por conta de nosso
Senhor. Sou um inconsciente? Falta-me um pouco de prudência? Não sei o que dizer,
são o instinto e o Espírito Santo que me guiam, guia-me o amor do meu povo
maravilhoso que segue Jesus Cristo. E depois rezo, rezo muito, todos nós neste
momento tão difícil devemos rezar muito por tudo o que está a acontecer no
mundo.”
in DN 08.11.2020
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QUE COISA
SÃO AS NUVENS
JOSÉ
TOLENTINO
MENDONÇA
LIDAR COM A REPETIÇÃO
VIVEMOS A PRIMEIRA VAGA PANDÉMICA COMO UM TRAUMA.
VIVEREMOS A SEGUNDA TAMBÉM ASSIM
A primeira vaga do vírus encontrou-nos impreparados. A segunda
também. Entre uma etapa e outra houve certamente quem vigiasse, quem mantivesse
o estado de alerta ou até antecipasse o cenário em que agora de novo entramos.
Mas o desejo de um regresso à normalidade era tanto que aqueles que puderam
removeram a memória do período anterior. O negacionismo não é só o dos outros e
tem múltiplas linguagens e faces dentro de nós. Agarrámo-nos ao verão como a um
reencontro com a liberdade, festejando-a como uma prova de vida,
convencendo-nos que o mais difícil havia passado, exorcizando nos dias amplos
daqueles meses e nas suas despreocupadas esplanadas a escuridão que, afinal não
há tanto tempo, tínhamos experimentado.
Vivemos a primeira vaga pandémica como um trauma. Viveremos a
segunda também assim. A primeira chegou-nos como o desabar de uma agressão e
descobrimo-nos, a essa áspera luz, mais vulneráveis do que alguma vez o
pensámos. A atual recidiva agrava o sentimento de que estamos impotentes e
sitiados, porque ao peso da pandemia propriamente dito soma-se agora o luto das
nossas ilusões, a fragilização trazida pelo cansaço e, aqui e ali, também uma
descontrolada explosão social de raiva. No fundo, trata-se de lidar com a
repetição, essa categoria com a qual nos precisamos reconciliar e da qual temos
muito a aprender.
Enquanto
a recordação nos faz, de certa maneira, voltar atrás, regressar ao passado como
o havíamos habitado, a repetição impele-nos a dar um passo em frente
Quando se lê, por exemplo, Kierkegaard perde-se o medo à categoria
de repetição. De facto, ele vai encontrar nesta categoria uma saída para o
impasse a que se tinha chegado na filosofia antiga entre os que sustinham, como
Parménides, que qualquer mutação no mundo físico deve ser considerada ilusória,
pois a realidade do ser é imutável, homogénea e imóvel, e os que defendiam,
como Heraclito, que a essência do mundo é movimento e contínuo devir.
Kierkegaard identifica na repetição a possibilidade de explicar melhor a vida
do que estas hipóteses da imobilidade permanente e da novidade absoluta
constante. E, ele próprio pergunta: “Que seria, ao fim de contas, a vida se não
ocorresse nenhuma repetição? Quem desejaria ser apenas um tabuleiro no qual o
tempo a cada instante escreve uma frase nova ou versa somente o historial de um
passado?” Para o filósofo dinamarquês, a repetição é a chave que explica a
nossa existência. Ele deixa claro, porém, que a repetição não pode ser vista como
um mero retorno do passado. Na verdade, mesmo quando nos desconcerta, ela é
também uma possibilidade de transcendência, na medida em que nos conduz a novos
estádios de aperfeiçoamento e progresso. Enquanto a recordação nos faz, de
certa maneira, voltar atrás, regressar ao passado como o havíamos habitado, a
repetição impele-nos a dar um passo em frente. Por isso, enfrentar a repetição
está entre os deveres éticos e espirituais mais sérios.
Sabemos, contudo, que a experiência da repetição nem sempre é indolor.
Como ajudou a ver Freud, também acontece que a repetição se relacione com
alguma coisa que não ficou resolvida lá atrás no tempo, alguma coisa cuja
solução nos escapou e esse falhanço se torna um obstáculo pronto a pôr em causa
o que somos. É como se essa vivência primeira que interpretamos como fracasso
persistisse depois como uma deficiência, uma dívida ou uma perda que não chegou
a ser reparada e que agora nos aprisiona dentro do seu circuito cego através da
“compulsão da repetição”. O caminho paciente a trilhar passará pela
reelaboração desta espécie de sofrimento original, destapando-o e integrando-o,
num processo necessariamente lento. Mas não é raro que a esperança nos coloque
do lado da lentidão.
in Semanário Expresso 07.11.2020
https://leitor.expresso.pt/semanario/semanario2506/html/revista-e/que-coisa-sao-as-nuvens/lidar-com-a-repeticao
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À Procura da Palavra
DOMINGO XXXII COMUM
Pe. Vitor Gonçalves
“Vigiai, porque não sabeis o dia nem a hora.” Mt 25, 13
Esperar é sair ao encontro
Somos seres apressados. Lidamos mal com a espera, com o tempo que algumas coisas demoram a fazer-se, com as senhas e as filas de qualquer espécie (a do lado parece sempre ir mais depressa do que a nossa). Sim, há muita lentidão em certas coisas e a burocracia da vida parece ter os seus especialistas. Buscamos a eficiência e a rapidez, o lucro fácil e o imediato, e aquilo que demora um pouco mais começa a enfraquecer a nossa capacidade de resistência e a fidelidade ao compromisso. Oscilamos entre “quem espera sempre alcança” e “quem espera, desespera”. A dolorosa pandemia que vivemos não revela tantas dificuldades em assumirmos atitudes que exigem resiliência e esperança?
São numerosas as passagens dos
Evangelhos em que Jesus convida à vigilância, à leitura dos sinais dos tempos,
à atenção voltada para o futuro, a estar preparados, ao anúncio da vindo Filho
do Homem. Não são anúncios de desgraças nem sementeira de medos; pelo contrário,
são convite a viver despertos, de olhos abertos e atentos, com corações
inteligentes e generosos para acolher e ir ao encontro. Mesmo perante os
sofrimentos e desaires, as suas palavras ecoam: “Não tenhais medo”, “A paz
esteja convosco”. É uma vigilância cheia de esperança. Para aprender com os
acontecimentos e estar prontos a responder com sabedoria ao inesperado e à
incerteza.
As jovens de candeias acesas que
esperam o esposo para o acompanharem ao banquete falam de nós, da Igreja, do
mundo que espera a felicidade. A noite que alarga a espera pode fazer-nos
adormecer. Mas a vinda do esposo é certa. E teremos azeite na candeia da nossa
vida para iluminar o seu caminho? Este azeite que adverte para o perigo de
vivermos de modo inconsciente, num “vai-se andando” sem fulgor nem encanto,
“vivendo porque a vida dura” (F. Pessoa), correndo atrás de fogos-fátuos que
nos prometem felicidades fáceis e vazias. Como nos ilumina o “fogo” que Jesus
veio lançar? Que sentido tem conservar uma fé gasta, que não move ao encontro
com Jesus? Se temos candeias acesas, a melhor espera é sair ao encontro.
Esperamos sintonizados com os sofrimentos e os desafios do mundo, levando nas
nossas candeias a luz que é Jesus Cristo.
A esperança cristã não é passiva. Não
é demissão, mas compromisso. Sabemos com quem nos vamos encontrar. Porque Ele
mesmo já veio ao nosso encontro. Que o seu nome é Pai e Amigo. É Amor. No tempo
que nos é dado, somos responsáveis pelo cuidado do mundo e pela felicidade dos
outros. A nossa brotará das sementes que lançarmos. Da beleza que ajudarmos a
revelar-se e daquela que também criarmos. Esperamos de coração escancarado. Em
saída para o encontro
A esperança cristã não é passiva. Não
é demissão, mas compromisso. Sabemos com quem nos vamos encontrar. Porque Ele
mesmo já veio ao nosso encontro. Que o seu nome é Pai e Amigo. É Amor. No tempo
que nos é dado, somos responsáveis pelo cuidado do mundo e pela felicidade dos
outros. A nossa brotará das sementes que lançarmos. Da beleza que ajudarmos a
revelar-se e daquela que também criarmos. Esperamos de coração escancarado. Em
saída para o encontro.
in Voz da Verdade, 08.11.2020
http://www.vozdaverdade.org/site/index.php?id=9312&cont_=ver2
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