Entre o mal maior e o maior bem está o extenso mundo onde a existência humana se tece. Humanas ou desumanas vidas, como se vê, por um encadeado de causas. É a distância sem medida entre aquele que mata alguém por lhe ter pisado os calos e o que perguntou ao soldado romano por que razão lhe deu uma bofetada. A distância entre a malvadez e o perdão, ajuizados pela verdade das coisas. No meio desse grande campo entre estes dois marcos está uma espécie de justiça: aquela que tira um olho ou um dente a quem antes os tirou a outrem. Não sei se o dente e o olho tirados para vingarem os anteriores seriam arrancados da mesma maneira. Seria mais justo. Diz-se que já não é mau o mal menor. Enfim, alguma coisa ou alguém é poupado. Apesar de ser muito frequente a indignação às portas dos tribunais, são infinitamente preferíveis 25 anos de cadeia para quem matou do que mais uma morte. Ainda assim, é grande a distância entre o mal menor e o bem menor. Faz lembrar o comentário de Jesus sobre João, o Baptista: ele é o maior do antigo, mas o mais pequeno do novo é maior que ele. Para medir a distância entre a malvadez e o perdão não há medida humana. Malvadez é o mal sem medida. Houve uma espécie de rei chamado Herodes, de quem se diz ter mandado matar todas as crianças com menos de dois anos por constar que entre elas havia uma que lhe poderia tirar o poder. Coitado, morreu muito mal. Há uma espécie de gente que mantém outros povos submetidos, subalimentados e enganados para lhes roubar os bens que têm nas suas terras. Coitados desses que nunca se sentem satisfeitos. Temos uma espécie de escritor que na TV contou só metade da história da mulher sirofenícia (Marcos 7, 24-39) para afirmar que Jesus afinal descriminava as pessoas, e desse modo promover a venda de um livro seu. Coitado, só ganha mais dinheiro. O perdão é o oposto da malvadez, é o bem sem limites. Um homem devolveu em multiplicado tudo quanto tinha adquirido ilegitimamente (o que é o legítimo!) ao sentir a alegria de ser perdoado. Chamava-se Zaqueu. Uma mulher mudou de vida ao ter a surpresa do perdão quando aguardava o fatalismo da condenação. Os que a acusavam de ser adúltera tiveram assim, por meio dela, oportunidade de mudarem também de vida. Perdoar é, antes de mais, não entrar no jogo de responder ao mal com outro mal, mas promover o esclarecimento, a consciência das coisas, as razões das acções ou das palavras. “Se respondi bem, porque me bateste? Se respondi mal, diz-me em quê”. Foi esta a resposta de Jesus ao soldado romano. É também assim que se dá a outra face. A outra face pessoal e a outra face da vida.
Frei Matias, O.P.
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