23 fevereiro 2020


P / INFO: Crónicas & On summit anniversary, what we still don’t know about clerical abuse
Frei Bento: Acabar com o clericalismo
Pe. Anselmo: O Sagrado e suas configurações (1)
Pe. Tolentino: QUERIDA AMAZÓNIA
Pe Vitor: O amor é inventivo
 NOTA: Lamento imenso a desformatação deste mail. Foi o melhor que consegui

ACABAR COM O CLERICALISMO
Frei Bento Domingues, O.P.

1. Para acabar com o clericalismo que o Papa Francisco tantas vezes tem denunciado, importa desconstruir a eclesiologia que o produz e fundamenta. Sem esse trabalho, a concepção de Igreja do Direito canónico, que vigorou desde 1917 até 1983, desde Pio X até ao Vaticano II, reaparecerá quando menos se espera. Nessa eclesiologia o clero era tudo, tinha a primeira e a última palavra. Ao laicado restava-lhe ouvir, obedecer e sustentar o clero.
Nunca faltaram minorias para contestar esse culto da passividade perante uma hierarquia que se julgava omnisciente e omnipotente em nome de Deus[1].
Sem a desconstrução desse mundo de fantasias e práticas autoritárias, é impossível encontrar o que é essencial, o que é secundário e o que é de rejeitar na caminhada cristã. Sem essa redescoberta, continuaremos a construir sobre a areia, a alimentar ilusões com novas embalagens religiosas de produtos de fraca qualidade.
O Vaticano II iniciou, oficialmente, essa desconstrução, essa tentativa de encontro com o essencial da fé cristã. Ficou muito aquém do que era necessário e ainda nem sequer foi interiorizada a grandeza da sua mudança de perspectiva e de conteúdo.
No trabalho de desconstrução, D. António Ferreira Gomes, nas Cartas ao Papa[2], lembrou que um bispo português – Frei Bartolomeu dos Mártires – tinha proposto, no Concílio de Trento, uma eminentíssima e reverendíssima reforma dos cardeais. D. António disse que isso já não bastava. Toda a reforma será baldada se não incluir o desaparecimento da função cardinalícia. Esta merece um bom funeral.
Depois de tanta exortação à reforma dos cardeais, da cúria, Bergoglio talvez venha a reconhecer a perspicácia da proposta radical do antigo Bispo do Porto.
Santo Agostinho encontrou o rumo certo:« Atemoriza-me o que sou para vós; consola-me o que sou convosco. Pois para vós sou Bispo; convosco sou cristão. Aquilo é um dever; isto, uma graça. O primeiro é um perigo; o segundo, a salvação».
Tomás de Aquino, na Summa Theologiae[3], foi directo ao essencial, ao que ainda continua ignorado na prática pastoral, sacramental e litúrgica: «o que há de mais poderoso na lei do Novo Testamento e, no qual, consiste toda a sua energia é a graça do Espírito Santo que é dada pela fé em Cristo. A Lei Nova é principalmente a graça do Espírito Santo». Tudo o resto é só para apoiar e exprimir esta centralidade.
Ele próprio lembra a 2ª Carta aos Coríntios – a letra mata, o espírito vivifica – assim como o comentário de Santo Agostinho: «por letra entende-se todo o texto escrito, objectivamente existente fora de nós, inclusive os preceitos morais contidos no Evangelho; mataria também a própria letra do Evangelho se, interiormente, não estivesse presente a graça da fé».
 Segundo a Carta aos Hebreus, Jesus era em tudo semelhante aos seus irmãos para ser um sumo-sacerdote misericordioso e fiel no serviço de Deus[4]. Estes irmãos de Cristo participam do seu sacerdócio. Como também diz o primeiro Papa, S. Pedro, «Vós sois linhagem escolhida, sacerdócio real, nação santa, povo adquirido por Ele»[5].
O culto dos irmãos de Cristo sacerdote foi expresso na Carta aos Romanos: exorto-vos, irmãos, pela misericórdia de Deus, a que ofereçais os vossos corpos como sacrifício vivo, santo, agradável a Deus. Seja este o vosso verdadeiro culto, o espiritual[6].
Na Carta aos Gálatas, Paulo é ainda mais acutilante: «Todos vós sois filhos de Deus em Cristo Jesus, mediante a fé; pois todos os que fostes baptizados em Cristo revestistes-vos de Cristo mediante a fé. Não há judeu nem grego; não há escravo nem livre; não há homem e mulher, porque todos sois um só em Cristo Jesus[7].
2. Esta é a verdadeira eclesiologia de comunhão. A diferença natural entre homens e mulheres não é abolida no renascimento simbolizado pelo baptismo, mas em Cristo os homens não são mais cristãos do que as mulheres, não são mais sacerdotes do que as mulheres. No Novo Testamento, o vocabulário sacerdotal é exclusivo de Cristo e dos irmãos de Cristo, sejam homens sejam mulheres.
Os ministérios, isto é, os serviços da comunidade cristã, não são designados como sacerdotais. Com o desenrolar da história da Igreja, confiscaram o vocabulário sacerdotal para os presbíteros e para os bispos. Na realidade, só podem ser designados como sacerdotes indirectamente: estão ao serviço do povo sacerdotal de Cristo.
A Lumen Gentium, nº 10, reconhece «o sacerdócio comum dos fiéis e o sacerdócio ministerial ou hierárquico, embora se diferenciem essencialmente e não apenas em grau, ordenam-se mutuamente um ao outro; pois um e outro participam, a seu modo, do único sacerdócio de Cristo».
A desgraça é que o segundo passou a ser o principal. E o principal, o sacerdócio comum dos fiéis, passou para segundo plano ou completamente esquecido. O clero confiscou a realidade sacerdotal de todo o povo cristão por causa de uma distinção real, mas formulada de forma ambígua. A liturgia eucarística é obra de toda a comunidade e não, apenas, dos padres e dos bispos. A todos pertence tornar visível, palpável, sensível a presença invisível de Cristo nas celebrações. Ninguém faz as vezes de Cristo, ninguém O substitui.
3. Como observa o grande eclesiólogo dominicano já citado, Hervé Legrand, «é difícil negar que, ao longo da história, se tornaram sobreavaliados teologicamente os efeitos da ordenação. Descreve-se o “sacerdote” como outro Cristo, mediador entre Deus e os homens e “sacerdote” para a eternidade». Referindo-se a Jean-Jacques Olier, transcreve algo verdadeiramente delirante: os chamados sacerdotes são «as fontes fecundas inesgotáveis de todas as graças; tudo o que se realiza de santo, de grande e de divino, na Igreja, emana deles e opera pelo seu santo ministério. O sacerdote participa com o Pai e com o Filho no poder de enviar o Espírito Santo ao mundo».
A Lumen Gentium tentou reequilibrar eclesiologias quase opostas. Esta reconstrução precisa de ser refeita. De outro modo, esbarramos com as dificuldades e as confusões que não foram superadas na Carta sobre o Sínodo da Amazónia. Temos que voltar a este assunto.

in Público, 23.02.2020
https://www.publico.pt/2020/02/23/sociedade/opiniao/acabar-clericalismo-1905084


[1] Hervé Legrand, Abusos sexuales y clericalismo, in Selecciones de Teología, Vol. 58 (2019), nº 232, 362-370
[2] Cartas ao Papa, Figueirinhas, Porto, 2ª edição 1987, Carta XII, 241-250
[3] I-II q. 106-108
[4]  Hb 2, 14-18
[5]  1Pd 2, 9
[6] Rm 12, 1
[7] Gal 3, 27-28

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O Sagrado e suas configurações (1)
Anselmo Borges

Como ficou dito em crónicas anteriores, o Sagrado é o referente último de todas as religiões, o mistério da realidade na sua ultimidade. É o Sagrado ou o Mistério pura e simplesmente. É o Inominável, pois transcende sempre tudo quanto se possa pensar ou dizer dele. Nenhuma religião o possui nem mesmo as religiões todas juntas.
Na experiência do Sagrado, fonte de sentido último, salvação e felicidade, o homem está sempre em presença de algo outro e superior, "o tremendo e fascinante", o Absoluto, inabarcável, inacessível e inefável.
Esta superioridade do Sagrado manifesta-se em níveis diferentes: o ontológico - infinita riqueza de ser -, o axiológico - realidade sumamente valiosa. Assim, comporta "uma rutura de nível que aponta para a plenitude de ser e realidade por excelência" (J. Sahagún Lucas).
Sendo o Inominável, procurou-se, ao longo da história, nomeá-lo. Numa obra recente, Después de Dios..., o teólogo José Ignacio González Faus apresentou várias tentativas, com muitos nomes. Os Upanishades referem-se a ele como "O Incondicionado"; as filosofias mais racionalistas designam-no como "O Absoluto"; Santo Tomás de Aquino disse que o seu melhor nome é precisamente "O Inominável"; Tierno Galván, "a partir do seu agnosticismo despreocupado pelo tema", designa-o por vezes como "O Fundamento"; Karl Rahner, o maior teólogo católico do século XX, fala dele precisamente como "O Mistério"; Rudolf Otto, autor da obra famosa Das Heilige, fala dele precisamente como "O Santo", "O Sagrado"; Platão referia-se a ele como "a ideia do Bem", mas é necessário notar que Platão chama ideia à verdadeira realidade, contraposta às sombras, sendo assim o Sagrado o Sumo Bem; Aristóteles designou-o como "O Motor Imóvel", com o sentido de que, no meio de todas as mudanças, é necessário algum "ponto de referência firme"; mesmo o famoso tetragrama hebraico YHVH, letras impronunciáveis, não é um nome próprio, mas "uma resposta evasiva a Moisés": "sou o que serei": confia e irás vendo; o Novo Testamento conclui que "Deus é Amor", que não é uma definição, pois não diz "Deus é O Amor". O místico João da Cruz referiu-se-lhe como "a música calada que enamora".
Que concluir? Deus é "esse Mistério indizível que nos envolve. Neste sentido, à pessoa que se sente ou se julga 'muito religiosa' é preciso pedir-lhe que renuncie um pouco a Deus, não para negá-lo, mas para deixar Deus ser Deus. Frequentemente, os que mais falam de Deus são os que de modo pior acreditam n'Ele". É também neste contexto que deve entender-se o que uma vez ouvi a Jacques Lacan: "Os teólogos não acreditam em Deus, porque falam dele." Talvez mais decisivo do que falar de Deus seja falar com Deus.
De qualquer forma, ao longo da história e sempre, o Sagrado, na medida em que o homem precisa de nomeá-lo de alguma maneira, foi sendo apresentado de múltiplas formas e em várias configurações, desde o politeísmo ao monismo, passando pelo dualismo, o deísmo, o monoteísmo... como veremos em próximas crónicas.
Padre e professor de Filosofia
in DN, 23.02.2020
https://www.dn.pt/opiniao/opiniao-dn/anselmo-borges/o-sagrado-e-suas-configuracoes-1-11850717.html
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QUE COISA SÃO AS NUVENS

JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA
QUERIDA AMAZÓNIA
O PAPA TEM INSISTIDO A QUE CONTRARIEMOS O DÉFICE DE CAPACIDADE DE SONHAR QUE PARECE HOJE TER ACOMETIDO O MUNDO
Não só os católicos mas muitos homens e mulheres de boa vontade sentem uma dívida de gratidão para com o magistério profético do Papa Francisco. E se quiséssemos traduzir numa expressão o que transversalmente lhe devemos, talvez a encontrássemos agora escrita na exortação pós-sinodal que ele acaba de publicar, à maneira de um programa de ação: o “ampliar de horizontes”. O mundo contemporâneo, a braços com uma mudança epocal sem precedentes, tentado a adotar um egoísmo preventivo e um agravar da conflitualidade, precisa de escutar este apelo que nos recorda que o conflito nos fecha e a dialética reduz dramaticamente o nosso campo de visão num momento em que, pelo contrário, a realidade nos chama a superar perspetivas limitadas, a sondar “outros caminhos, talvez ainda não imaginados”, e a ampliar horizontes. Numa exortação que, desde as primeiras palavras, se parece a uma amigável carta escrita ao mundo, Francisco, partindo do pressuposto de que “as verdadeiras soluções nunca se alcançam amortecendo a audácia”, introduz o conceito de “transbordamento”, afirmando que está aí a via de saída que temos, como sociedades, de identificar. Que conceito é este de “transbordamento”? É curioso que o Papa proponha como via de saída (civilizacional, política, eclesial) uma categoria que se liga à própria natureza da vida e à sua organização profunda. Temos, assim, de escutar a grande lição da vida. Porque “a vida é transbordante” na sua matriz e é desse modo que ela se exprime e propaga. E quando essa possibilidade é negada mais se acentua a contradição entre o que a realidade poderia ser e o que ela é, de facto. Por isso, escreve Francisco: “Quanta dor e quanta miséria,/ quanto abandono e quanto atropelo nesta terra bendita,/ transbordante de vida!”
É curioso que o Papa proponha como via de saída (civilizacional, política, eclesial) uma categoria que se liga à própria natureza da vida e à sua organização profunda
Na mesma linha, o Papa tem insistido a que contrariemos o défice de capacidade de sonhar que parece hoje ter acometido o mundo. Dirigindo-se aos jovens em agosto de 2018, ele desafiava a que tivessem sonhos, porque sem eles não se poderá entender a vida, a força da vida. Mas os grandes, os verdadeiros sonhos — esclarecia então — são os “sonhos do nós”, não apenas os “do eu”. E recomendava: “Sede peregrinos na estrada dos vossos sonhos, arriscai fazer essa estrada.” E em dezembro desse ano, numa homilia em Santa Marta, afirmava: “O sonho é um lugar privilegiado para procurar a verdade. Tantas vezes o próprio Deus escolheu falar através dos sonhos.” Sintomaticamente, a exortação “Querida Amazónia” está estruturada a partir de quatro sonhos nos quais o Papa deseja envolver-nos. São “sonhos do nós”. 1) Um sonho social, porque uma abordagem ecológica sistémica não separa o clamor da terra do grito dos pobres. Não se pode cuidar do bioma amazónico sem pensar nas condições de vida dos povos amazónicos e sem garantir o seu protagonismo e a sua dignidade. 2) Um sonho cultural, porque a promoção do território amazónico não se opera por um desenraizamento da identidade cultural dos seus povos mas sim preservando a imensa riqueza cultural que a caracteriza. 3) Um sonho ecológico, porque o equilíbrio do planeta depende da saúde do ecossistema amazónico. A proteção da “vida transbordante que enche os seus rios e as suas florestas” tornou-se uma urgência global. É o destino da Humanidade inteira que se joga ali. 3) Um sonho eclesial, porque a Igreja é chamada a desenvolver processos reais de inculturação que permitam o acontecer de um verdadeiro encontro com o Evangelho. Como diz o Papa: “Sonho com comunidades cristãs capazes de se devotar e encarnar de tal modo na Amazónia que deem à Igreja rostos novos com traços amazónicos.”
in Semanário Expresso, 21.02.2020
https://leitor.expresso.pt/semanario/semanario2469/html/revista-e/que-coisa-sao-as-nuvens/querida-amazonia
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À PROCURA DA PALAVRA
P. Vitor Gonçalves
DOMINGO VII COMUM Ano A
“Amai os vossos inimigos
e orai por aqueles que vos perseguem.”
Mt 5, 44
O amor é inventivo
Uma das perguntas que toda a criança começa a ouvir desde cedo é esta: “O que queres ser quando fores grande?” E as respostas suscitam admiração, aprovação ou condescendência dos adultos que gostam demasiado de fazer aterrar os sonhos infantis. É interessante que se pergunta sobre “ser”, confundindo-o com “fazer”. É claro que também somos aquilo que fazemos. Gostei especialmente daquele pequenito que respondeu simplesmente: “Quando for grande quero ser melhor!”
A tarefa de “completar” alguns mandamentos da Lei, que Jesus empreende no discurso da montanha, culmina com uma afirmação que parece inatingível: “sede perfeitos como o vosso Pai celeste é perfeito”. Há aqui um horizonte que parece utópico, fora do normal, desprovido de bom senso, mas é o horizonte cristão, pois é aquele que convida sempre a caminhar, a inventar respostas novas e melhores para os problemas de sempre: os conflitos, as violências, os ódios, os “nossos e os outros”. Ninguém tinha ousado antes de Jesus falar com tal radicalidade acerca do ódio e da vingança. E se a lei de talião tinha aplicado a justiça de não haver vingança que ultrapassasse a falta, e o amor ao próximo incluía exclusivamente os judeus, Jesus rasga o horizonte. Não basta pensar que o próximo é o que pensa como eu ou é dos “meus”; todos os filhos de Deus são meu próximo!
Jesus radicaliza a renúncia à não violência (sem deixar de nos dar o exemplo de quando foi bofeteado na paixão confrontar aquele que lhe batera: “porque me bates?”). E também à ganância da posse (causa de tantas violências!), das coisas (túnica e manto) e do tempo (acompanhar uma / duas milhas). Sempre a surpreender, a “trocar as voltas” a quem espera respostas violentas, a sacudir e a protestar com gestos inesperados, a utilizar o amor inventivo como alavanca para mover as montanhas que endurecem os corações e cegam o pensamento.
Não há nada mais grandioso, mais específico e mais difícil de viver do que o amor aos inimigos. O amor e a oração pelos que nos odeiam têm como referência o Pai que está nos Céus, que dá o sol e a chuva a todos. Dá tudo a todos, pois não tem inimigos. E nós a gostarmos de colocar este “rótulo” aos que não acreditam n’Ele! E se a referência é o amor do Pai, vemo-nos perante a “impossibilidade” de alguma vez sermos como Ele, não é? Mas como pode Jesus propor-nos algo impossível? Lembramos como em S. Lucas, num texto paralelo, Jesus diz-nos para sermos “misericordiosos”, compassivos como é o Pai. E esse modo de falar da perfeição, não como algo “pleno”, mas em movimento, é mais próximo da nossa humanidade, entendível como próprio dos seguidores de Jesus. Tem o sabor daquela frase da criança que “queria ser melhor”, e a ousadia do amor criativo e inventivo que não se acomodas nem se instala, e dos sonhos faz realidade!
in Voz da Verdade, 23.02.2020
http://www.vozdaverdade.org/site/index.php?id=8782&cont_=ver2
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On summit anniversary, what we still don’t know about clerical abuse
John L. Allen Jr.
EDITOR
News Analysis

ROME - Today marks the one-year anniversary of Pope Francis’s historic summit on the clerical sexual abuse crisis in February 2019, which brought together presidents of the world’s bishops’ conferences to promote a global culture of transparency and accountability.
Coincidentally, the milestone falls as the world is focused on a very different kind of epidemic: The coronavirus, which to date is believed to have killed more than 2,100 people across mainland China, though fewer than 10 outside the country. The global total of infected people stands at about 75,600, the vast majority in China’s Hubei province.
The juxtaposition at first glance may seem unrelated, but there is a sort of link.
Consider that two months into the coronavirus outbreak, we can speak with basic statistical confidence about how many victims there are and where they are, at least outside the epicenter. As is well documented, China initially tried to cover up the disease, and there are still serious doubts about whether it’s being forthcoming regarding the extent of new infections and deaths. Still, dogged researchers across the world are hard at work trying to get at the reality of the situation, and we have a fairly good handle on infections and treatments elsewhere.
By way of comparison, decades into the clerical abuse crisis there’s still no such hard data about its global reach.
There’s reasonably solid information about the number of cases and victims, and therefore the percentage of priests guilty of abuse, in the United States, Australia, Ireland, Germany and other settings which have been epicenters of the crisis, but we don’t have much clue about the spread elsewhere.
What tends to fill that gap are a priori assumptions, reflecting the perspectives and biases of whoever’s talking.
For instance, Archbishop Marcel Utembi Tapa of Kisangani in the Democratic Republic of Congo, by far the largest Catholic country in Africa in terms of population, has said that “cases are rare in our country.” In that, Utembi is reflecting the kinds of things many African bishops have said since the outbreak of the abuse crisis in the late 1990s and early 2000s:
Child sexual abuse by clergy is mostly a Western issue.
Given the social stigma against homosexuality in Africa, priests preying on boys doesn’t happen on a wide scale.
To the extent Africa has a problem with sexual misconduct by clergy, it takes other forms, especially relationships with adult women.
One can hear similar things from bishops in other parts of the world. Most survivors scoff in response, insisting such comments reflect denial.
During a press conference this week in Rome organized by the US-based group BishopAccountability, a question came up about clerical abuse around the world. The axiomatic answer was that it must be similar to what we know about the US and elsewhere - meaning somewhere around 5 to 8 percent of clergy guilty of abuse. The comparatively low number of cases reported in the Congo or the Philippines, therefore, must be a reflection of poor reporting and cultures of shame that discourage victims from coming forward, not a real difference across geographic regions.
Yet the study of epidemiology, very much in the air due to the coronavirus outbreak, tells a different story.
As one might imagine, the spread of disease is a subject that’s been keenly studied by health organizations and researchers. One consistent finding is that the spread of an epidemic or pandemic is terribly uneven. Even where different populations face exactly the same risk of exposure, how hard they’re hit is dependent on a number of factors, including overall health levels, exposure to unsafe water and food, the quality of health care systems, the nature of the diet, air quality levels, and any number of other things.

In other words, medical researchers will tell you it’s not useful in combating disease to make assumptions about what causes it, how it spreads, and whether its impact is the same everyplace. Instead, you have to collect the data and then try to make sense of it, rather than starting with a model and massaging the data to fit.
Granted, the analogy between a virus and the clerical abuse crisis is inexact, among other things because a disease is generally a natural phenomenon while the sexual abuse of a child is an abominable crime. Nevertheless, the comparison is instructive.
Is it possible, for instance, that there was something in Western cultures during the peak years of the crisis that produced a level of abuse not seen elsewhere? Or, is it possible that the crisis is actually far worse in other settings that lack a legal and cultural support system for victims to seek redress, where clericalism is far more rampant, and where cultural attitudes towards sexual relations with adolescents and even children are radically different?
The only answer to either question right now is, “Sure, that’s possible, but we really don’t know.” One can try to apply generalized data from the World Health Organization about child abuse worldwide, for instance, which suggests levels are depressingly high pretty much everywhere, but that’s inexact.
That, in turn, brings us back to where things stand one year from the pope’s summit.
What’s striking is how much still isn’t understood. Neither ecclesiastical nor civil authorities in most parts of the world have invested the resources to provide a reliable picture, so we’re left with guesswork and projections.
For sure, the immediate work of identifying abusers and those who covered up for them is critically important, among other things because it’s what tends to spark lawsuits, grab headlines and drive protest. Yet the slower and less sensational task of understanding the origins and distribution of clerical abuse, including the environmental and cultural factors which either encourage or obstruct it, also merit a spot on the to-do list.
Perhaps expanding the infrastructure to do that kind of research is one resolution to take away from this anniversary - because, let’s face it, “disease” is an unfortunate fact of life in the Catholic Church as much as anywhere else, and it would be nice to have a reliable tracking system for where and how it spreads.
in Crux, Feb 21, 2020
https://cruxnow.com/news-analysis/2020/02/on-summit-anniversary-what-we-still-dont-know-about-clerical-abuse/ 


19 fevereiro 2020

Presos políticos, A morte medicamente assistida e a eutanásia,Os selfistas,Um salto para o alto & Archbishop says married priests still up for debate


P / INFO: Crónicas & Archbishop says married priests still up for debate
Frei Bento: Presos políticos
Pe. Anselmo: A morte medicamente assistida e a eutanásia
Pe. Tolentino: Os selfistas
Pe Vitor: Um salto para o alto
PRESOS POLÍTICOS
Frei Bento Domingues, O.P.

1. Ontem, no Auditório Camões (Lisboa), foi realizada uma Sessão Cultural inscrita nas comemorações dos 50 anos da Comissão Nacional de Socorro aos Presos Políticos (CNSPP). 50 anos não é uma eternidade, mas é tempo suficiente para se perder a memória acerca do que não deve ser esquecido. A referida comissão teve, felizmente, uma existência breve, de 1969 a 1974, pelo melhor dos motivos: o 25 de Abril. O seu percurso está bem documentado[1]. Além disso, vai sair, em breve, um novo e interessante estudo sobre essa documentação com uma proposta de enquadramento, enquanto movimento social, que exige alguma discussão que não cabe nesta crónica[2]. Tentarei, ainda que brevemente, referir a sua originalidade exemplar.
Um grupo de cidadãos, integrado por dezenas de personalidades de sectores sociais, profissionais e áreas geográficas diversas, entregou na Presidência do Conselho de Ministros um documento, datado de 15 de Novembro de 1969, no qual anunciava a constituição da CNSPP, baseada no artigo 199 do Código Civil. Neste estava prevista a formação de comissões especiais, não sujeitas ao reconhecimento oficial, para acções de socorro ou beneficência. Os signatários consideravam que a existência de presos políticos era justamente uma situação de calamidade[3]. Deve dizer-se de calamidade nacional na medida em que a polícia política, com diversos nomes ao longo dos anos, tentava fazer do medo a prisão do país e da intervenção política um risco ameaçado com a cadeia.
A CNSPP procurava responsabilizar o Governo e alertar a opinião pública perante a gravidade da permanente violação das liberdades e direitos fundamentais, pela actuação da polícia política todo-poderosa, ao abrigo de uma legislação penal perversa, sob arbítrio de um tribunal especial. Além do auxílio prestado aos presos políticos e às suas famílias, por forma directa, constituiu sempre preocupação desta comissão a constante chamada à responsabilidade de todos aqueles que integravam as engrenagens da repressão política.
Essas tomadas de posição tiveram as mais variadas formas de expressão, nelas se incluindo exposições de factos concretos sobre a situação dos presos, telegramas e cartas de protesto quanto ao tratamento de que eram vítimas pelas autoridades policiais e prisionais, denúncias de abusos e ilegalidades praticadas por essas mesmas autoridades.
2. O primeiro comunicado da CNSPP foi lançado ao país, de modo a não ser interceptado, a 20 de Janeiro de 1970. As actividades da referida comissão só foram possíveis pela aceitação que encontraram, tanto no País como no estrangeiro, especialmente na Europa. É de referir, também, o enorme interesse e a solidariedade que o problema dos presos políticos em Portugal merecia de organizações humanitárias, sindicais e mesmo políticas em diversos países, bem como de numerosos meios de informação.
Depois da queda do regime (25 de Abril 1974), uma vez que todos os presos políticos tinham sido libertados, foi convocada uma reunião para saber se a Comissão devia continuar ou não. Não foi sem discussão que se decidiu a sua extinção, pois as regras concretas de um regime democrático ainda não estavam claras e longe de serem consolidadas, como a seguir se verificou.
O último volume de Documentos (1972-1974) é precedido de uma Nota Prévia, datada de 5 de Outubro de 1974, que faz uma exacta avaliação do percurso da CNSPP e cuja leitura é indispensável para quem desejar conhecer essa aventura de resistência à ditadura.
Seria no entanto ridículo supor que, antes da CNSPP, não existiam movimentos e grupos de diversas configurações de socorros aos presos políticos. Mas sem ignorar e sem dispensar a actuação de qualquer das iniciativas existentes, aconteceu algo de inédito e exemplar. Esta comissão era constituída por pessoas de várias orientações ideológicas, políticas, culturais e religiosas com o objectivo de socorrer os presos políticos e suas famílias sem acepção de pessoas. Todos os presos políticos eram socorridos da mesma maneira pelas diversas intervenções da comissão. À comissão só lhe interessava a condição de preso político sem mais considerações.
Era a própria existência de presos políticos que constituía um atentado contra os direitos humanos. Era essa a primeira tortura que permitia todas as outras requintadas loucuras e arbitrariedades, destinadas a quebrar todas as resistências físicas e psicológicas do preso, que tinha cometido o crime de lutar contra a ditadura. É, aliás, essa situação que mostra a diferença entre democracias e ditaduras.
A actividade cívica, humanitária e política da CNSPP foi reconhecida pela Assembleia da República, atribuindo o Prémio Direitos Humanos de 2010 a dois dos seus membros – Frei Bento Domingues e Dr. Levy Baptista – em representação da Comissão, e com a reedição das 23 circulares informativas publicadas entre 1970 e 1974.
3. As hesitações referidas acerca da extinção da CNSPP não eram totalmente despropositadas. Em nome do êxito da revolução, surgiram várias iniciativas em contradição com o espírito das reivindicações da CNSPP. O Prof. Ruy Luís Gomes, perante um projecto de lei revolucionário, reagiu: «Este projecto é indigno dos gloriosos militares que fizeram a revolução de 25 de Abril. É profundamente anti- democrático, na parte em que autoriza a punição criminal da discordância política e, pior ainda, na parte em que repõe em vigor as hediondas “medidas de segurança” com que o fascismo sempre perseguiu os seus opositores. Se este projecto, tal como está, é para ser transformado em lei, então mais valia não ter feito Revolução nenhuma: bastava ter feito um golpe de Estado e pôr os novos carrascos a aplicar as mesmas leis dos antigos!»[4].
O 25 de Abril pôs fim a uma longa ditadura, mas não podia, do pé para a mão, desenvolver uma cultura da responsabilidade democrática. Sabemos isso e não falta quem deseje, hoje, servindo-se das instituições democráticas, restaurar uma ditadura que não conheceu[5].
in Público, 16. 02. 2020
NOTA: A esta hora esta crónica ainda não está  on line


[1] PRESOS POLÍTICOS – Documentos 1970/1971 e 1972/1974Comissão Nacional de Socorro aos Presos Políticos, Iniciativas Editoriais, Lisboa, 1974
[2] Edgar Freitas Gomes Silva, Vencer o Medo. Arquitetura da Comissão de Socorro aos Presos políticos, no Prelo da Editora Afrontamento, Porto
[3] Cf. Nuno Teotónio Pereira, Tempos, Lugares, Pessoas, Edições Público, pp. 61-63
[4] Diogo Freitas do Amaral, O Antigo Regime e a Revolução. Memórias Políticas (1941-1975), Bertrand / Nomen, 1995, 320-321; Por teu livre pensamento. Histórias de 25 ex-presos políticos portugueses. Textos de Rui Daniel Galiza; Fotografias de Joao Pina, Assírio & Alvim, 2007.
[5] Ver o artigo de Francisco Bethencourt, Democracia, in Público (04.12.2019) e o de Irene Flunser Pimentel, Populismo de extrema-direita, o inimigo a combater, in Público (13.02.2020).

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A morte medicamente assistida e a eutanásia
Anselmo Borges
Numa sociedade economicista, de individualismo e egoísmo atrozes, ergue-se o perigo gravíssimo de pessoas serem "empurradas" a pedir a eutanásia e, pior, muitos interiorizarem inclusivamente a obrigação de a pedir. Isso não obriga a pensar?
Não é por acaso que este texto tem por título "a morte medicamente assistida e a eutanásia". É que, em primeiro lugar, nestes debates de vida e de morte é preciso ser claro e não induzir em erro as pessoas de forma manhosa: morte medicamente assistida é uma coisa, eutanásia é outra... O grande filósofo Hegel lembrou a urgência de conceitos claros, pois "de noite todos os gatos são pardos" e, no meio da confusão, ninguém se entende, e, nessas circunstâncias, em problemas que têm que ver com o limite o mais provável é cair no abismo.
Evidentemente, a posição da Igreja na questão da eutanásia só pode ser, mesmo no caso de um referendo - a Conferência Episcopal Portuguesa acaba, tarde, de se manifestar favorável nas presentes circunstâncias ao referendo -, a de uma oposição contundente e propugnando a defesa dos cuidados paliativos e a presença plena, humana e cristã, junto de quem se encontra em dificuldades, na solidão, na dor, no sofrimento e a caminho do fim. Aliás, essa presença solidária tem de ser durante a vida toda, para vivermos dignamente, sabendo que da vida digna faz parte a morte digna: viver dignamente e morrer dignamente. Mas previno que o que está em questão não é, em primeiro lugar, a religião, mas valores fundamentais, constitutivos, da civilização, de tal modo que a aprovação da eutanásia significaria um retrocesso e mesmo uma ruptura civilizacional.
Embora compreenda os argumentos a seu favor - há vários textos meus nos quais explico esses argumentos -, quero que fique bem claro que eu me oponho à eutanásia e a que o debate sobre o seu pedido volte à Assembleia da República. Porque é que os principais partidos não debateram abertamente a questão durante a recente campanha eleitoral nem a colocaram nos programas? Não estou só a pensar nos perigos da rampa deslizante: lembro que, nos pouquíssimos países onde o pedido de eutanásia é legal, esta rampa ou plano inclinado existe de facto, com alargamento quantitativo e qualitativo de pedidos aceites e autênticos casos de abuso (homicídio) reconhecidos - por exemplo, está em curso na Bélgica uma acusação contra um pediatra por nove "eutanásias disfarçadas". E qualquer pessoa fica preocupada com a notícia que chega da Holanda "da pílula sem dia seguinte", como, no seu modo sempre arguto, atirou o eurodeputado Paulo Rangel: "Todas as pessoas que fazem 70 anos receberão como prenda de aniversário um comprimido com o qual podem suicidar-se. E depois quem é que controla o destino destes comprimidos? Às tantas, vamos ter gente a matar outra gente" (Público, 9 de Fevereiro). Porventura as pessoas com 70 anos valem menos do que quem tem 50 ou 30? Confesso: isto, a ser verdade, significa o colapso de uma sociedade.
Ainda no contexto da rampa deslizante, é preciso não ser ingénuo. Numa sociedade economicista, de individualismo e egoísmo atrozes, ergue-se o perigo gravíssimo de pessoas serem "empurradas" a pedir a eutanásia e, pior, muitos interiorizarem inclusivamente a obrigação de a pedir. Isso não obriga a pensar?
É uma vergonha para uma sociedade querer debater e despenalizar a eutanásia quando ainda não tem uma rede de meios paliativos minimamente suficientes. Os doentes, em casos extremos, precisamente porque o Estado lhes não garante apoios suficientes para a sua existência minimamente digna, são colocados perante o insuportável, de tal modo que se ergue de modo dramático a pergunta: nessas circunstâncias, onde está a sua liberdade para pedir a eutanásia?
Há uma razão que diria metafísica para a oposição à pena de morte, a mesma para se opor à eutanásia. Penso, por exemplo, em L. Wittgenstein, para quem o mundo é o conjunto dos factos, verificáveis. Mas, para lá do verificável, há "o místico" (das Mystische), que "se mostra", o metafísico, o absoluto. Não como o mundo é, mas que o mundo seja é o místico, escreveu Wittgenstein. Deus também não é deste mundo, nem a ética, que é da ordem do dever ser e não dos factos. O morrer é deste mundo, mas a morte não é deste mundo. A morte, digo eu, é uma das faces do absoluto, a outra é Deus, e, por isso, não é deste mundo. Ora, a pena de morte é a condenação à morte eterna para este mundo, fechando a abertura à continuidade do processo de possibilidades, incluindo a do arrependimento e emenda, de retomar a existência na sua dignidade. Nenhuma instância terrena poderá, pois, fazer o juízo final, definitivo, de uma pessoa. E é preciso contar sempre com o perigo do erro no julgamento. Aí está porque não se pode ser a favor da pena de morte nem a favor da eutanásia. Aliás, quando alguém pede a morte por eutanásia, está a pedir o quê? Que grau de liberdade tem? E se entretanto se arrepender e quiser recuar?... Ai, os mistérios da existência humana e da liberdade! A dignidade da pessoa humana, inviolável, convive com a vulnerabilidade e, por isso, do que precisamos é de uma ética da fragilidade e do cuidado.

Mais. Se algum dia se avançasse por esta via da legalização da eutanásia, o Estado ficaria com mais uma obrigação: satisfazer o direito ao pedido da eutanásia e seria confrontado com esta pergunta terrível: quem mata? Porque é disso que se trata, não se venha com o eufemismo enganoso, porque manhoso e mentiroso, de "morte medicamente assistida", pois assistência médica, psicológica, familiar, afectiva, pastoral, religiosa (se for o caso) todos querem. No que o Estado deve pensar é na urgência dos cuidados paliativos, que ainda não chegam à maioria dos doentes; num relatório recente (cf. jornal i, 16 de Janeiro), lê-se que de 102 mil doentes que preencheriam os requisitos para beneficiar de cuidados paliativos em 2018, apenas um quarto teve acesso a este tipo de resposta que visa aliviar o sofrimento físico e psicológico em casos de doença incurável avançada e progressiva. As lacunas são ainda maiores nas crianças: em oito mil menores com doenças incuráveis, só 90 tiveram acesso a este tipo de cuidados, 0,01%. Concluiu-se que faltam 430 médicos, 2114 enfermeiros e 173 assistentes sociais nesta área. Conclusão: perante a sobrecarga, o tempo dedicado aos doentes é pouco: os médicos têm em média 44,5 minutos por semana com cada doente (nove minutos por dia). O mesmo se diga dos enfermeiros e assistentes sociais.
É uma vergonha para uma sociedade querer debater e despenalizar a eutanásia quando ainda não tem uma rede de meios paliativos minimamente suficientes. Os doentes, em casos extremos, precisamente porque o Estado lhes não garante apoios suficientes para a sua existência minimamente digna, são colocados perante o insuportável, de tal modo que se ergue de modo dramático a pergunta: nessas circunstâncias, onde está a sua liberdade para pedir a eutanásia? Afinal, pedem a morte ou apoio e alívio na dor, para continuar a viver dignamente e morrer dignamente? Aí está a razão por que, no contexto da precipitação para que a eutanásia volte ao Parlamento, logo após a aprovação do OE para 2020, observam alguns e não necessariamente cínicos: a eutanásia poderia ajudar bastante certos orçamentos de Estado, a Segurança Social!...
Evidentemente, opor-se à eutanásia não é ser a favor da distanásia e da obstinação terapêutica, que podem ser imorais. Deve-se aliviar a dor, mesmo que isso apresse a morte. Uma coisa é matar e outra deixar morrer em tempo oportuno e com dignidade, sem prolongar a vida artificialmente e de forma desproporcionada.
Ainda no contexto da rampa deslizante, é preciso não ser ingénuo. Numa sociedade economicista, de individualismo e egoísmo atrozes, ergue-se o perigo gravíssimo de pessoas serem "empurradas" a pedir a eutanásia e, pior, muitos interiorizarem inclusivamente a obrigação de a pedir. Isso não obriga a pensar?
É uma vergonha para uma sociedade querer debater e despenalizar a eutanásia quando ainda não tem uma rede de meios paliativos minimamente suficientes. Os doentes, em casos extremos, precisamente porque o Estado lhes não garante apoios suficientes para a sua existência minimamente digna, são colocados perante o insuportável, de tal modo que se ergue de modo dramático a pergunta: nessas circunstâncias, onde está a sua liberdade para pedir a eutanásia?
Há uma razão que diria metafísica para a oposição à pena de morte, a mesma para se opor à eutanásia. Penso, por exemplo, em L. Wittgenstein, para quem o mundo é o conjunto dos factos, verificáveis. Mas, para lá do verificável, há "o místico" (das Mystische), que "se mostra", o metafísico, o absoluto. Não como o mundo é, mas que o mundo seja é o místico, escreveu Wittgenstein. Deus também não é deste mundo, nem a ética, que é da ordem do dever ser e não dos factos. O morrer é deste mundo, mas a morte não é deste mundo. A morte, digo eu, é uma das faces do absoluto, a outra é Deus, e, por isso, não é deste mundo. Ora, a pena de morte é a condenação à morte eterna para este mundo, fechando a abertura à continuidade do processo de possibilidades, incluindo a do arrependimento e emenda, de retomar a existência na sua dignidade. Nenhuma instância terrena poderá, pois, fazer o juízo final, definitivo, de uma pessoa. E é preciso contar sempre com o perigo do erro no julgamento. Aí está porque não se pode ser a favor da pena de morte nem a favor da eutanásia. Aliás, quando alguém pede a morte por eutanásia, está a pedir o quê? Que grau de liberdade tem? E se entretanto se arrepender e quiser recuar?... Ai, os mistérios da existência humana e da liberdade! A dignidade da pessoa humana, inviolável, convive com a vulnerabilidade e, por isso, do que precisamos é de uma ética da fragilidade e do cuidado.
Mais. Se algum dia se avançasse por esta via da legalização da eutanásia, o Estado ficaria com mais uma obrigação: satisfazer o direito ao pedido da eutanásia e seria confrontado com esta pergunta terrível: quem mata? Porque é disso que se trata, não se venha com o eufemismo enganoso, porque manhoso e mentiroso, de "morte medicamente assistida", pois assistência médica, psicológica, familiar, afectiva, pastoral, religiosa (se for o caso) todos querem. No que o Estado deve pensar é na urgência dos cuidados paliativos, que ainda não chegam à maioria dos doentes; num relatório recente (cf. jornal i, 16 de Janeiro), lê-se que de 102 mil doentes que preencheriam os requisitos para beneficiar de cuidados paliativos em 2018, apenas um quarto teve acesso a este tipo de resposta que visa aliviar o sofrimento físico e psicológico em casos de doença incurável avançada e progressiva. As lacunas são ainda maiores nas crianças: em oito mil menores com doenças incuráveis, só 90 tiveram acesso a este tipo de cuidados, 0,01%. Concluiu-se que faltam 430 médicos, 2114 enfermeiros e 173 assistentes sociais nesta área. Conclusão: perante a sobrecarga, o tempo dedicado aos doentes é pouco: os médicos têm em média 4,5 minutos por semana com cada doente (nove minutos por dia). O mesmo se diga dos enfermeiros e assistentes sociais.
É uma vergonha para uma sociedade querer debater e despenalizar a eutanásia quando ainda não tem uma rede de meios paliativos minimamente suficientes. Os doentes, em casos extremos, precisamente porque o Estado lhes não garante apoios suficientes para a sua existência minimamente digna, são colocados perante o insuportável, de tal modo que se ergue de modo dramático a pergunta: nessas circunstâncias, onde está a sua liberdade para pedir a eutanásia? Afinal, pedem a morte ou apoio e alívio na dor, para continuar a viver dignamente e morrer dignamente? Aí está a razão por que, no contexto da precipitação para que a eutanásia volte ao Parlamento, logo após a aprovação do OE para 2020, observam alguns e não necessariamente cínicos: a eutanásia poderia ajudar bastante certos orçamentos de Estado, a Segurança Social!...
Evidentemente, opor-se à eutanásia não é ser a favor da distanásia e da obstinação terapêutica, que podem ser imorais. Deve-se aliviar a dor, mesmo que isso apresse a morte. Uma coisa é matar e outra deixar morrer em tempo oportuno e com dignidade, sem prolongar a vida artificialmente e de forma desproporcionada.

Aceitei figurar entre os 101 mandatários, como o antigo Presidente da República Ramalho Eanes, ou o médico e antigo bastonário Germano de Sousa, de uma petição a favor de um referendo sobre a matéria
O bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, disse-o de modo perfeito. Cito uma entrevista sua a Marta Reis no jornal Sol, 11 de Janeiro. Em primeiro lugar, esclarecer: "O que temos de fazer, e esse é o aspecto mais importante, é dar o máximo de informação para o debate. Não é infrequente estar em reuniões com deputados, pessoas que se vão pronunciar, e confundem ainda eutanásia, a morte a pedido num caso de doença grave, com distanásia, que é prolongar a vida de uma pessoa indevidamente, prolongar a vida de alguém numa fase terminal em que o que se deve oferecer é o máximo de conforto."
E a autonomia do doente? Continuou Miguel Guimarães: "O doente tem autonomia para dizer que não quer fazer tratamentos. Um doente com cancro pode recusar um tratamento. Mas no caso da eutanásia, falamos de uma participação activa na morte, o código deontológico proíbe." Mesmo a nível internacional, "encara-se sempre a eutanásia como um acto médico. Não é. Não faz parte de nenhum compêndio que matar uma pessoa seja um acto médico, é a antítese do acto médico. Quando se diz que dar a uma pessoa um medicamento para matar tem de ser feito por um médico não percebo a justificação".

Chamo a atenção para o facto de, por exemplo, a França, que está a rever leis de bioética, ter excluído do debate a eutanásia e, no limite, ser favorável à sedação profunda e continuada.

Já quase em post scriptum, quero dizer que aceitei figurar entre os 101 mandatários, como o antigo Presidente da República Ramalho Eanes, ou o médico e antigo bastonário Germano de Sousa, de uma petição a favor de um referendo sobre a matéria. É que, no meio da confusão que indiquei no início, e quando até deputados, como ficou dito, não sabem distinguir entre eutanásia, distanásia, ortotanásia e suicídio medicamente assistido..., impõe-se um debate amplo, nacional, para que todos os portugueses sejam ouvidos e possam ficar minimamente esclarecidos sobre o que está em causa.
Padre e professor de Filosofia. Escreve de acordo com a antiga ortografia.
in DN, 16.02.2020
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QUE COISA SÃO AS NUVENS
JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA
OS SELFISTAS

A PROPOSIÇÃO QUE MOVE A SELFIE É AGORA ESTE VIDEOR ERGO SUM (SOU VISTO LOGO EXISTO), PROPAGADO POR TODA A PARTE
A selfie tornou-se um sintoma do tempo em que vivemos. Se pensarmos na fotografia tradicional era claro o seu papel em relação à temporalidade da vida: a fotografia, fixando o tempo, como que o prolongava, assumindo-se, no confronto com a nossa existência, como uma arte da memória. Não é por acaso que imprimíamos as fotografias e as recolhíamos num álbum, e deixámos de o fazer com o material fotográfico que simplesmente acumulamos nos telemóveis. Quer dizer que a função da imagem mudou. A fotografia tradicional pretendia ser ainda um registo ao serviço da interpretação da vida. O seu processamento chamava-se justamente “revelação”, pois era disso que se tratava, e não só a um nível imediato, mas numa profusão de detalhes significativos que a simples visão normalmente não deteta. Na sua “Pequena História da Fotografia”, Walter Benjamin afirma, por exemplo, que na fotografia fazemos a experiência do “inconsciente ótico”, do mesmo modo que as psicoterapias nos permitem aceder ao “inconsciente pulsional”. A fotografia testemunhava assim, de um modo amplo e singular, o domínio visível do sujeito, mas também nos avizinhava do seu campo invisível.
A selfie, pelo contrário, transaciona sobre o imediato, como se o sujeito histórico se tivesse tornado evanescente e a sua duração (histórica, psicológica...) se dissolvesse para permitir que a aparição instantânea se torne um fim. A proposição que move a selfie é agora este videor ergo sum (sou visto logo existo), propagado por toda a parte. Mas fazer depender a existência deste tipo de visibilidade dá razão àquilo que o psiquiatra italiano Giovanni Stanghellini escreve num ensaio recente (“Selfie. Sentirsi nello sguardo dell’altro”, Feltrinelli, 2020): “a instantaneidade da selfie é semelhante à temporalidade esfomeada e sem fôlego de um ataque bulímico”. De facto, para compreendermos a contemporânea bulimia que nos torna a todos produtores ininterruptos de imagens temos de procurar a razão de fundo que permanece escondida, e que é uma dramática anorexia em relação ao ser.
A fotografia testemunhava assim, de um modo amplo e singular, o domínio visível do sujeito, mas também nos avizinhava do seu campo invisível
É verdade que enquanto a fotografia tradicional nos permitia dizer “eu sou esta pessoa”, a selfie nos parece fazer dizer “eu estou aqui”. Mas este “aqui” é um espaço atópico, errante, que nunca chega a ser habitado. Por isso se caracteriza justamente o selfista como um turista e não já como um viajante. Enganamo-nos, portanto, se pensamos que a selfie serve para assinalar a nossa passagem por um determinado lugar: ela é sim o resultado de uma radical desterritorialização da vida, capturada pela ânsia da comunicação virtual, mais do que pelo desejo de documentar o real.
O que procuramos então nas selfies? Stanghellini explica que buscamos uma “prótese” existencial, uma “técnica de si” ativada para dar uma resposta ficcional à necessidade de fundar a própria identidade. Perante a exigência de nos definirmos a nós próprios, em tempos de “aporia identitária”, a selfie é “o dispositivo que responde (que tenta responder) à pergunta ‘quem sou?’”. Mas este psiquiatra que dirige uma escola de psicoterapia em Florença é dirimente: “O mito da instantaneidade como satisfação alucinatória da necessidade de vizinhança ou de ultrapassagem da distância transforma a experiência do sujeito apenas numa sequência sincopada de acontecimentos isolados e encerrados neles mesmos. E quando pedimos aos outros para assistir — se bem que ao longe — a estes acontecimentos, é porque só nos sentimos presentes quando fazemos de nós próprios um espetáculo.” Não admira que a era da selfie seja também a do crepúsculo do rosto.
in Semanário Expresso, 16.02.2020
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À PROCURA DA PALAVRA
P. Vitor Gonçalves
DOMINGO V COMUM Ano A
“Eu, porém, digo-vos:
Todo aquele que se irar contra o seu irmão
será submetido a julgamento?”
Mt 5, 22

Já o filme “Corpus Christi”, do realizador polaco Jan Komasa, caminha para o seu epílogo quando o jovem saído do reformatório que assumiu o papel de padre daquela aldeia, trespassada por uma tragédia, inicia a missa com estas palavras: “Eu sou um assassino. Eu matei. Matei nos meus pensamentos. Matei no que fiz. Matei no que não fiz. Sabem no que somos bons? Em desistir das pessoas. Em apontar o dedo para elas. Perdoar não significa esquecer. Não significa fingir que não aconteceu. Perdoar significa amar. Amar alguém apesar da sua culpa. Não importa que culpa.”
No alto da montanha, Jesus apresenta seis antíteses como um salto em frente e para o alto da lei que Israel guardava como tesouro. Uma lei que era colocada diante do homem, para que ele a pudesse escolher, como bem diz o livro de Ben-Sirá: “Se quiseres, guardarás os mandamentos: ser fiel depende da tua vontade.” Tem na sua base o que S. Agostinho descreverá como “livre arbítrio”, a possibilidade que existe em todo o homem normal de dizer sim ou não. Mas também S. Agostinho fala de uma liberdade maior (libertas) que conduz o homem a realizar-se na harmonia, na gratuidade, numa altura que toca o infinito. Assim, a lei de Israel, e de modo peculiar os mandamentos, são apresentados por Jesus como preparação para a medida maior e a transbordar da vida de Deus em nós. “Ouvistes o que foi dito…Eu, porém, digo-vos”!
Jesus inicia este contraponto com o quinto mandamento: “Não matarás!” Não se trata apenas da agressão física ou da eliminação de alguém. O homicídio parte sempre do coração: as palavras, os olhares, a excomunhão, a impossibilidade de reconciliação, que geram distância e indiferença são “pequenas-grandes mortes”. É preciso desarmar os corações. Recusar a facilidade de destruir quem fez o mal. No fundo, como insiste Jesus, o outro é um irmão: por quatro vezes assim é referido. Então, a possibilidade de reconciliação é o único caminho que liberta da prisão da morte. Porque quem está morto não é aquele que fez o mal mas aquele que recusa a reconciliação. Ela é mais importante até do que o acto religioso de fazer uma oferta a Deus: pode o Pai acolher com alegria a oferta de um filho que odeia o irmão?
Não basta “não matar”; é preciso “dar vida”. Promovendo o encontro com a verdade, denunciando as prisões do egoísmo e do facilitismo, cultivando a proximidade e a atenção mútua, partilhando os bens e os dons mútuos, recusando desistir dos outros. Assim o fez o “falso padre” naquela comunidade ferida. Assim o fazemos quando não defendemos apenas ideias mas nos gastamos, e gastamos tudo, para o maior bem de todos. O salto para o alto que o Evangelho propõe é difícil. Mas é aquele que levanta a nossa vida!
in Voz da Verdade, 16.02.2020
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14 FEBRUARY 2020, THE TABLET
Archbishop says married priests still up for debate
by Sarah Mac Donald

Querida Amazonia is a cry from the heart to protect the environment of the Amazon region.

The head of the Catholic Church in Ireland, Archbishop Eamon Martin, has said he is “very much open” to the ordination of married men as priests and that Pope Francis didn’t “shut the idea down” but left it open for further discussion within the Church.
In an interview with RTE Radio’s Morning Ireland programme about the 94-page exhortation, Querida Amazonia, the Archbishop of Armagh said: “I think this question is very much still open.”
He added: “I am very much open to the idea of this and I think Pope Francis is too” but the Pontiff “chose not to mention” the priestly ordination of married men in the letter as he realised that it is a question where there is a lot of “divided thinking”.
“It’s been said he refused this or refused that; he’s actually left the question. I think that he’s done that in order to encourage all of us to focus on much bigger questions about Church ministry, organisation, the involvement of lay people in the Church, the involvement of women in the Church, and he calls on the local Church there to actually officially recognise these roles in a way which it hasn’t done until now.
“I understand that there has been disappointment, and a lot of people feeling that perhaps this was a moment at which Pope Francis was going to express his views on the ordination of married men as priests. But I think Pope Francis would be disappointed if this is the issue that we are all talking about today,” Archbishop Eamon Martin said.
The Archbishop, who has recently returned from visiting two of the countries of the Amazon region, Peru and Ecuador, stressed that the exhortation is a huge cry from the heart to try to protect that region which is being “cruelly destroyed by the exploitation of its resources, by the destruction of its natural beauty and its life”.

The Pope, he said, was underlining that the whole world has a responsibility to try to preserve the equilibrium of the planet which so much depends on the health of the Amazon and the eco systems there.
Asked about the vocations crisis in Ireland, Dr Martin indicated that the situation was considerably different to where the Amazon is at. He also suggested that more Irish priests should go to the Amazon as missionaries.
“I know that we think we are very short of priests but I think a church which loses it missionary spirit and its missionary zeal is a church which is dying. And I think that is what Pope Francis is saying to us. Stay missionary, get out there, go and help these people.”
However, Fr Paddy Byrne, a popular parish priest in the Diocese of Kildare and Leighlin told the same RTE programme that he was “taken aback” and “disappointed” by Pope Francis’ refusal to approve the ordination of married men to address a priest shortage in the Amazon.
Fr Byrne said about 85 per cent of priests in Ireland shared his sense of disappointment. “We are not far away from the reality of what is being felt by the people of the Amazon region,” he warned and highlighted that there are "probably more bishops in Ireland at the moment" than there are young men in formation for priesthood.
“So if we don’t change we are facing the exact same (as the Amazon),” he told RTE.
Separately, a priest who is married but hasn’t been laicised told The Tablet that his immediate reaction to the Apostolic Letter was “one of disappointment” but “that just forced me to read Querida Amazonia”.
Sixty-two-year-old Liamy McNally was ordained for the archdiocese of Tuam in 1985, but two years later fell in love and left public ministry. He has never left the priesthood. He lives three miles from the Co Mayo town of Westport which has a population of about 5,500. In this small area, he knows six married priests, only one of whom is in ministry. A former Columban missionary, the priest married a nun and they both became Anglicans, serving in the local Church of Ireland.
“I found Querida Amazonia poetic, encouraging and deeply challenging,” McNally said and added the Pope had stated at the outset that he was not going to deal with all the issues raised at the Synod.
“I guess if he dealt directly with the question of married clergy then that would have be the ‘story'. The major issues facing the Amazon would have become footnotes. He obviously didn’t want that so he is leading us deeper into the challenges of the Amazon region.”
Describing the document as “wildly rich and in many ways, revolutionary, even without reference to married clergy”, Liamy McNally noted Para 105 which states, “…In its earliest days, the Christian faith spread remarkably in accordance with this way of thinking, which enabled it, from its Jewish roots, to take shape in the Greco-Roman cultures, and in time to acquire distinctive forms. Similarly, in this historical moment, the Amazon region challenges us to transcend limited perspectives and ‘pragmatic’ solutions mired in partial approaches, in order to seek paths of inculturation that are broader and bolder.”
According to Liamy McNally: “Some people believe that when Pope Francis appears to be closing one door he is preparing to push open a bigger door. It will take time to digest what has been written and then we’ll see what happens.”
Asked about Archbishop Eamon Martin’s comment about being “open” to the question of married priests, McNally responded: “So are most people. Any survey will show that. The issue is when will the Irish Bishops Conference start discussing it? We need to move from being ‘open’ to deeper, public discussion and examination of what the possibilities are.”
Elsewhere, Colm Holmes, Chair of We Are Church International, also praised the Pope for his “wonderful dreams for social, cultural and ecological issues in the Amazon.”
Dublin-based Holmes said: “We agree with the Pope that our church has significant responsibility for promoting immediate and significant changes in how the earth’s resources and the lives and cultures of indigenous people are protected. We urge all people to live in ways that reflect good stewardship of our planet, and the fact we are all one human family.”
However, he went on to say: “It is tremendously disappointing that Pope Francis could not bring the same vision to how our church serves the people of the Amazon region, and indeed all people. Despite the explicit request of the bishops and people from the area, the Pope failed to open priesthood to married men or to consider ordaining women to the diaconate.
“He proposes vague ‘new forms of service’ for women, but reaffirms the ban on women from ordination, thereby ensuring additional responsibility without accompanying authority.”
He said the Pope’s dreams for changing church structures in the Amazon are “discouragingly lacking in specifics. After seven years in office, it seems he talks the talk but does not walk the walk when it comes to enabling the church to fully address the real needs of its members.”
in The Tablet, 14.02.2020