29 setembro 2013

FRANCISCO, UM AMIGO LÁ DE CASA

     
1. A ressurreição do obviamente humano e cristão, nos gestos e nas palavras do Papa Francisco, depois dos artificiosos muros levantados, nas últimas décadas, por condenações e propaganda - ocultando crimes financeiros e comportamentos pedófilos - tornou-se a mais pacífica, profunda e surpreendente revolução do nosso tempo. Este processo exemplar tem uma história.

        Não esqueçamos que o anúncio do Vaticano II aconteceu de modo totalmente inesperado. João XXIII, sem consultar ninguém, desarrumou séculos de “tridentinismo”. O desenvolvimento do Magistério pontifício, depois do concílio de Trento (1543-1563), acentuado no séc. XIX e prolongado na primeira metade do séc. XX, atingiu, com Pio XII, o paroxismo. A centralização romana multiplicou intervenções repressivas, alimentadas por delacções e processos tenebrosamente secretos. Por outro lado, depois da declaração da “infalibilidade papal” no Vaticano I (1869-1870), embora muito circunscrita, tudo o que vinha de Roma passou a ter uma auréola sagrada: era indiscutível.

2. A turbulência desencadeada antes, durante e depois do Vaticano II só se compreende tendo em conta esse longo e complexo tempo eclesial de resistência, criatividade e repressão. Ninguém de bom senso poderia supor que tudo se resolveria com a aplicação de documentos conciliares ao conjunto da Igreja situada em universos geográficos, culturais, religiosos, económicos e políticos tão diversos.

A reforma desejada, na linha aberta por João XXIII, foi sistematicamente adiada em vários domínios e, mais do que isso, contrariada. Os processos instaurados pela Congregação para a Doutrina da Fé ao pensamento cristão mais inovador pareciam querer restaurar um  tempo de má memória. A debandada de padres, religiosos, religiosas e militantes católicos foi uma tristeza. Quando se falava da necessidade de um novo concílio, a resposta disponível era sempre a mesma: ainda não foi posto em prática o Vaticano II como se vai entrar na aventura de um terceiro?

O próprio “Ano da Fé” serviu para abafar os questionamentos que o cinquentenário do Concílio poderia levantar. Optou-se por fazer dele um assunto de arquivo, em vez de uma provocação para o século XXI.

Bento XVI mostrou-se incapaz de reformar a Cúria - a que pertenceu durante muitos anos – e de convocar um novo Concílio. Preferiu demitir-se e provocar um conclave electivo, tornando possível outro caminho.

3. Nestes últimos anos, foram muitos os grupos e movimentos, de homens e mulheres, de religiosos, religiosas, de padres, de teólogos, teólogas que manifestaram a urgência de reformas na Igreja, em diversos sectores de vida, organização, ministérios e actividades. A divulgação das notícias, das análises e das propostas, a nível local e geral, alargou e aprofundou a consciência eclesial de muitos cristãos. Parece que essas iniciativas não encontraram muito eco na Cúria romana e nos últimos Papas. Por vezes serviram, até, para levantar, nas paróquias e nas dioceses, a suspeita de que se tratava de pessoas e grupos pouco católicos, de reduzido amor à Igreja, de falta de respeito pelos seus pastores e indignos de se reunirem nos espaços das congregações religiosas e das paróquias. Nenhum desses movimentos teve muito tempo para conferir o que este Papa estava a concretizar ou não, ao nível das reformas desejadas e formuladas. O próprio Papa não teve de esperar pela realização de algumas propostas e medidas que preconizou. Em seis meses de pontificado não aconteceu nada de extraordinário e aconteceu tudo o que é essencial. O Papa Francisco manifestou, por atitudes, gestos e palavras que deseja ser um homem cristão ao serviço de uma Igreja de todos – todos somos Igreja - que sirva o mundo a partir dos mais pobres e excluídos. Não fez um tratado acerca do que deve ser um papa, um bispo, um padre, um cristão no mundo de hoje. Começou por ser isso tudo, à vista de toda a gente.

Teve, com certeza, de se converter ao longo da vida – ainda se confessa, com verdade, um pecador – para matar as tentações de carreirismo eclesiástico e tornar-se um pároco simples que considera o mundo todo, de crentes e não crentes, como a sua paróquia. Perdeu a pose episcopal, cardinalícia, papal. As pessoas começaram a considera-lo da sua família, um amigo lá de casa. Um amigo incómodo que levanta questões aos instalados no dinheiro e no poder.

Foi à Sardenha dizer que o mundo tem um falso centro, o ídolo Dinheiro, que instala a cultura do descarte: descartam-se os idosos e os jovens, uns porque não podem trabalhar e outros porque não têm trabalho, condição da dignidade, pois significa levar pão para casa e amar.

Deus colocou, no centro do mundo, a mulher e o homem, a família humana. Para denunciar, de modo eficaz, o actual centro idolátrico do mundo, é preciso não ser ingénuo. Bastará a astúcia da serpente e a bondade da pomba?

Continuaremos a conversar com o amigo lá de casa.

Frei Bento Domingues, O.P.

29.09.2013

in Público

28 setembro 2013

Cinquenta Minutos de Paz

                                      Digo Eu
Cinquenta Minutos de Paz
Hoje, a T. apanhou-me de surpresa. Não é que eu saiba ou possa adivinhar o que ela me vai dizer, sempre que lhe atendo o telefone, todas as manhãs. A verdade é que não há grandes novidades nas nossas vidas de mulheres reformadas, sozinhas em casa, a dormir em cama vazia. As conversas vão seguindo quase sossegadas, a não ser quando há algum acontecimento muito emocional, como foi o caso de a T. se ter apaixonado no último verão ou de ter chorado um dia inteiro, por causa de um minúsculo bikini que usou na praia.
Podemos falar de sonhos ou de desejos, de projectos ou intenções. Combinamos um cinema, uma exposição, um café. Evitamos lembrar os telejornais, que nos atiram a matar as mais hediondas notícias. Não queremos mais ouvir a insensibilidade dos poderes, a incompetência dos partidos políticos, o empobrecimento injusto, o achatamento dos salários e das reformas. Recusamos a palavra “troika.” Tristes tempos, desabafamos a duas vozes, muitas vezes.
Hoje a T. disse-me o bom dia do costume, fez uma pausa para bem colocar a voz naquele tom que julga adequado aos assuntos realmente importantes.
E perguntou-me: -Tu és feliz?
-Espera aí, respondi-lhe. E muito depressa:- Acho que sim. Não sei. Tenho de pensar.
Ao mesmo tempo, disse eu para comigo própria que não é fácil responder a sério à pergunta, com um sorrisinho leve, que sim, sou feliz.
– Sabes que ser feliz está na moda?-  insistiu a T.
– Não sei eu outra coisa! – respondi no mesmo instante, para passar a comentar com ela a situação do nosso querido país, nesta questão existencial.
– Fazem inquéritos a torto e a direito, tentou a T. interromper-me. Mas eu, teimosamente, repeti-lhe os dados sobre a Felicidade há uns dias divulgados. E não senti nenhuns escrúpulos por quebrar a nossa regra de falarmos ao telefone dispensando as notícias deprimentes. Bem deprimentes.
Então, relembrei eu à T. que no Relatório Mundial sobre a Felicidade da ONU, Portugal desceu doze posições para o 85º lugar entre 156 países avaliados. Dinamarca, Noruega e Suiça são os primeiros e Togo, Benim e Republica Centro Africana vêm no fim. A agravar o quadro, também nos foi anunciado que 15 por cento dos portugueses sofre de ansiedade, e que somos o país europeu com maior taxa de depressão.
A T. reagiu, se calhar os dados do Relatório estão certos, a verdade é que os portugueses voltaram do mês de agosto ainda mais tristes, e depois destes números, pior ainda. E passou a falar-me sobre o que já nos últimos meses me tinha dito, ela própria tem andado à procura dessa tão desejada felicidade e acha que está a abrir-se para lá chegar. Saúde, alguma sorte, algum dinheiro para pagar as contas e um pouco mais, ela tem. Deixou de sentir tentação de consumos desnecessários, cuida da alimentação, anda muito a pé, carrega pesos por disciplina, tem sido mais atenta àqueles que estão à sua volta, encontra em si novos sentimentos de amor e compaixão.
A T., tão exuberante, tão excessiva, anda em fase de austeridade exterior e de reflexão interior. Aqui está um grande acontecimento. Ela, há muitos anos afastada da Igreja, descobre-se a viver uma espiritualidade que desconhecia. Foi ensinada a ter medo do inferno, a enunciar os pecados mortais, a ficar muda e quieta nas missas, sem perceber a complicação dos sermões de domingo. Não se considera uma convertida, porque nasceu e foi criada em puro ambiente de cultura cristã.
A personalidade do Papa Francisco, a maneira tão directa como fala, a justiça e a paz que pede para toda a humanidade impressionaram a T. Hoje, garante que outra dimensão a ilumina. Na rotina de todos os dias, ela sente que ganhou uma medida maior deste mundo. –Ter fé é não estar só, diz-me.
Enquanto a oiço, correm no meu pensamento as minhas horas felizes. – Sou feliz, sim. Nem sempre. Mas sim, sou feliz.
E dou-lhe o exemplo de um momento bom. Cinquenta minutos de paz, de beleza, de espiritualidade pura, que vivi no segundo sábado de setembro. O Concerto para Órgão na Igreja de São Vicente de Fora. Lisboa esplendorosa às 5 horas da tarde. E eu lá dentro, a par dos tantos outros homens e mulheres tão diversos, unidos no prazer absoluto da harmonia.   
Leonor Xavier
         in Jornal Sénior
         26.09.2013
 


26 setembro 2013

PASSEIO SOCRÁTICO

     
Ao viajar pelo Oriente, mantive contatos com monges do Tibete, da Mongólia, do Japão e da China. Eram homens serenos, comedidos, recolhidos em paz nos seus mantos cor de açafrão.

Outro dia, eu observava o movimento do aeroporto de São Paulo: a sala de espera cheia de executivos dependurados em telefones celulares; mostravam-se preocupados, ansiosos e, na lanchonete, comiam mais do que deviam. Com certeza, já haviam tomado café da manhã em casa, mas como a companhia aérea oferecia um outro café, muitos demonstravam um apetite voraz. Aquilo me fez refletir: Qual dos dois modelos produz felicidade? O dos monges ou o dos executivos?

Encontrei Daniela, 10 anos, no elevador, às nove da manhã, e perguntei: “Não foi à aula?” Ela respondeu: “Não; minha aula é à tarde”. Comemorei: “Que bom, então de manhã você pode brincar, dormir um pouco mais”. “Não”, ela retrucou, “tenho tanta coisa de manhã...” “Que tanta coisa?”, indaguei. “Aulas de inglês, balé, pintura, piscina”, e começou a elencar seu programa de garota robotizada. Fiquei pensando: “Que pena, a Daniela não disse: ‘Tenho aula de meditação!’”

A sociedade na qual vivemos constrói super-homens e supermulheres, totalmente equipados, mas muitos são emocionalmente infantilizados. Por isso as empresas consideram que, agora, mais importante que o QI (Quociente Intelectual), é a IE (Inteligência Emocional). Não adianta ser um superexecutivo se não se consegue se relacionar com as pessoas. Ora, como seria importante os currículos escolares incluírem aulas de meditação!

Uma próspera cidade do interior de São Paulo tinha, em 1960, seis livrarias e uma academia de ginástica; hoje, tem sessenta academias de ginástica e três livrarias! Não tenho nada contra malhar o corpo, mas me preocupo com a desproporção em relação à malhação do espírito. Acho ótimo, vamos todos morrer esbeltos: “Como estava o defunto?”. “Olha, uma maravilha, não tinha uma celulite!” Mas como fica a questão da subjetividade? Da espiritualidade? Da ociosidade amorosa?

Outrora, falava-se em realidade: análise da realidade, inserir-se na realidade, conhecer a realidade. Hoje, a palavra é virtualidade. Tudo é virtual. Pode-se fazer sexo virtual pela internet: não se pega aids, não há envolvimento emocional, controla-se no mouse. Trancado em seu quarto, em Brasília, um homem pode ter uma amiga íntima em Tóquio, sem nenhuma preocupação de conhecer o seu vizinho de prédio ou de quadra! Tudo é virtual, entramos na virtualidade de todos os valores, não há compromisso com o real! É muito grave esse processo de abstração da linguagem, de sentimentos: somos místicos virtuais, religiosos virtuais, cidadãos virtuais. Enquanto isso, a realidade vai por outro lado, pois somos também eticamente virtuais…

A cultura começa onde a natureza termina. Cultura é o refinamento do espírito. Televisão, no Brasil - com raras e honrosas exceções -, é um problema: a cada semana que passa, temos a sensação de que ficamos um pouco menos cultos. A palavra hoje é ‘entretenimento’; domingo, então, é o dia nacional da imbecilidade coletiva. Imbecil o apresentador, imbecil quem vai lá e se apresenta no palco, imbecil quem perde a tarde diante da tela. Como a publicidade não consegue vender felicidade, passa a ilusão de que felicidade é o resultado da soma de prazeres: “Se tomar este refrigerante, vestir este tênis, usar esta camisa, comprar este carro, você chega lá!” O problema é que, em geral, não se chega! Quem cede desenvolve de tal maneira o desejo, que acaba precisando de um analista. Ou de remédios. Quem resiste, aumenta a neurose.

Os psicanalistas tentam descobrir o que fazer com o desejo dos seus pacientes. Colocá-los onde? Eu, que não sou da área, posso me dar o direito de apresentar uma sugestão. Acho que só há uma saída: virar o desejo para dentro. Porque, para fora, ele não tem aonde ir! O grande desafio é virar o desejo para dentro, gostar de si mesmo, começar a ver o quanto é bom ser livre de todo esse condicionamento globocolonizador, neoliberal, consumista. Assim, pode-se viver melhor. Aliás, para uma boa saúde mental três requisitos são indispensáveis: amizades, auto-estima, ausência de estresse.

 Há uma lógica religiosa no consumismo pós-moderno. Se alguém vai à Europa e visita uma pequena cidade onde há uma catedral, deve procurar saber a história daquela cidade - a catedral é o sinal de que ela tem história. Na Idade Média, as cidades adquiriam status construindo uma catedral; hoje, no Brasil, constrói-se um shopping center. É curioso: a maioria dos shopping centers tem linhas arquitetônicas de catedrais estilizadas; neles não se pode ir de qualquer maneira, é preciso vestir roupa de missa de domingos. E ali dentro sente-se uma sensação paradisíaca: não há mendigos, crianças de rua, sujeira pelas calçadas...

Entra-se naqueles claustros ao som do gregoriano pós-moderno, aquela musiquinha de esperar dentista. Observam-se os vários nichos, todas aquelas capelas com os veneráveis objetos de consumo, acolitados por belas sacerdotisas. Quem pode comprar à vista, sente-se no reino dos céus. Se deve passar cheque pré-datado, pagar a crédito, entrar no cheque especial, sente-se no purgatório. Mas se não pode comprar, certamente vai se sentir no inferno... Felizmente, terminam todos na eucaristia pós-moderna, irmanados na mesma mesa, com o mesmo suco e o mesmo hambúrguer de uma cadeia transnacional de sanduíches saturados de gordura…

Costumo advertir os balconistas que me cercam à porta das lojas: “Estou apenas fazendo um passeio socrático.” Diante de seus olhares espantados, explico: “Sócrates, filósofo grego, que morreu no ano 399 antes de Cristo, também gostava de descansar a cabeça percorrendo o centro comercial de Atenas. Quando vendedores como vocês o assediavam, ele respondia: “Estou apenas observando quanta coisa existe de que não preciso para ser feliz.”
         Frei Betto, O.P.
        
         Frei Betto é escritor, autor, em parceria com Luis Fernando Veríssimo e outros, de “O desafio ético” (Garamond), entre outros livros.

in http://www.freibetto.org/index.php/artigos/41-passeio-socratico-frei-betto



 

 

22 setembro 2013

CATÓLICOS NÃO CRISTÃOS

    
1. Não forjei este título, algo paradoxal, mas que exprime um fenómeno tristemente actual. Não designa os cristãos não católicos. Os membros das Igrejas protestantes, anglicanas e ortodoxas consideram-se e chamam-se cristãos. Quando dizemos que não são católicos é para significar que não estão em plena comunhão com o bispo de Roma, embora essas Igrejas também se considerem católicas.

Que se entende aqui por católico não cristão? Para o teólogo Martín G. Ballester, de quem recebi esta designação, trata-se de alguém que se atribui o título de católico de forma excludente. Considera-se a medida do verdadeiro católico e só pode ser católico quem fôr como ele. Católico é o seu pronto-a-vestir.

Segundo Ballester, esses católicos costumam ser beligerantes. Reforçam a sua identidade na condenação do outro, isto é, naquilo que os separa. Procuram inimigos seja onde fôr, pois o que lhes dá vida é precisamente o inimigo. Além de beligerantes são intransigentes, incapazes de reconhecer algo de bom em quem não pensa como eles.

Este é o retrato do católico fundamentalista, sectário, em contradição com a própria palavra católico, que significa universal, resultado de uma ruptura com a situação vivida na igreja dos começos, desde a crise helenista, descrita pelos Actos dos Apóstolos, que levou à morte o diácono Estevão (Act. 7-15). Foi neste contexto de universalização que, em Antioquia, os discípulos receberam, pela primeira vez, o nome de cristãos (Act. 11, 25-26).

2. Jesus era judeu e os seus discípulos também. Teve alguns contactos, especialmente com estrangeiras, que o encheram de espanto, mas não foi um homem viajado como, por exemplo, S. Paulo. Abriu, no entanto, um caminho universalista no interior do seu povo. Não via o mundo a partir dos detentores do poder económico, político e religioso, mas a partir dos excluídos de todas essas formas de poder.

É esta a razão da recusa em aceitar que lhe chamassem Messias, Cristo. Só foi possível e necessário que os primeiros escritos da igreja o designassem assim – Jesus Cristo – porque a palavra, devido à prática histórica de Jesus de Nazaré, tinha mudado radicalmente de sentido. Nesse comportamento, essa designação deixou de pertencer ao vocabulário do poder e passou a significar serviço, generosidade extrema, vida dada.

São cristãos os que não se servem da Igreja para ter poder. É curioso notar que foram as mulheres, que nada pediram a Jesus – e que, durante o seu processo de condenação, nunca o abandonaram –, que ele encarregou de evangelizar os discípulos, isto é, de o seguirem só pela mística do serviço.

3. Ao que parece, o Papa Francisco criou mais um problema no Vaticano. Com a sua mania de ver o mundo a partir dos pobres e excluídos – dizem que ainda não descobriu que, na Igreja, as mulheres são as mais excluídas – ressuscitou a Teologia da Libertação, com décadas de suspeitas e repetidas censuras. Noticiários e comentários lamentam que ele não compreenda que a hora é do triunfo do capitalismo. Ao receber Frei Gustavo Gutiérrez, um dominicano peruano, considerado o pai da Teologia da Libertação, estaria a ser vítima de um comportamento regressivo. Julgava-se que esse método teológico estivesse para sempre enterrado e, com mais algum tempo, poderia merecer, quando muito, uma nota de roda pé nos tratados e manuais dos seminários e faculdades de teologia.

O Arcebispo de Lima e Primado do Perú, o Cardeal Juan Luis Cipriani, ao saber do encontro do Papa com Gustavo Gutiérrez, manifestou, numa radiomensagem, a sua indignação. Tinha exigido a este teólogo que rectificasse temas que continuam pendentes. Pelos vistos, esse dominicano preferiu outras companhias, o que é irritante.

O Arcebispo Gerhard Müller, Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé – nomeado por Bento XVI – acaba de fazer coincidir a publicação de uma obra, assinada por ele e por Gutiérrez, com o encontro do Papa com este teólogo maldito que, em declarações para o Vatican Insider, assinala que este Papa lhe faz lembrar João XXIII. O “que lhe interessa é o Evangelho, não exatamente uma teologia, no máximo uma teologia próxima da Teologia da Libertação. Falar da importância do pobre, do compromisso, da solidariedade com os pobres... isso é do Evangelho! E o Papa, no seu modo de actuar, manifesta-se muito evangélico”.

O referido Cardeal de Lima, J. Luis Cipriani, não aguenta o que aconteceu: “estou a ver que isto parece uma nova primavera de Gustavo Gutiérrez”.

Não está só. Igor Alexandre explicita a indignação de muitos: “uma múmia inca ressuscita artificialmente para afugentar os vivos. Gustavo Gutiérrez malvado, emissário do passado escabroso e marxistoide, regressa para se vingar dos que permaneceram fiéis à doutrina. Será evolução? Nenhuma. É só uma mudança de pele como os ofídios. Do grandote «tentón» Müller, um luterano até à medula, nada há a estranhar. Onde se juntam os abutres, aí esta o morto. (…) Avizinha-se um conluio de demónios teólogos da libertação”.

Gustavo Gutiérrez não gosta que lhe chamem o pai da Teologia da Libertação: “gostaria de ser conhecido como um daqueles que contribuiu para a libertação da Teologia”. Ao Papa Francisco ninguém vai exigir que se torne o teólogo que nunca foi, mas é normal que contribua para que as práticas de Teologia vivam em liberdade e paz na Igreja.
 
Frei Bento Domingues, O.P.
in Público
22.09.2013

As paixões do fogueteiro Almerindo


          Nas festas populares por onde passei durante o verão não ouvi foguetes a estoirar como era costume. Contudo nem por isso os incêndios foram menos. Ao mesmo tempo que presto homenagem aos admiráveis bombeiros com quem me cruzei, e neles a todos os bombeiros portugueses, quero recordar o extraordinário fogueteiro Almerindo, um rapaz que no ano passado não tinha mãos a medir pelas aldeias de um interior para ele desconhecido. A sua paixão era o fogo e os foguetes. Trabalhava no seu fabrico, na sua distribuição e mesmo no seu lançamento. O sopro da subida, o estalar ritmado, a descida traiçoeira das canas para lugar incerto enchiam-lhe os pulmões de satisfação e envolviam-lhe os sentidos de magia. Sendo jovem, pensava muitas vezes que o mundo dos foguetes era a sua única paixão. Mas um dia, num povoado improvável, a uma hora imprevista e de um modo imprevisível surgiu a Vanessa com aspecto de aparição. Ela não o via, apenas via o fogo a subir, a estalar ou a derreter-se em lágrimas coloridas descendo do céu. Mas o eco do rebentar dos foguetes fez-lhe sentir no peito umas vibrações que pensou serem ondas vindas do peito do fogueteiro. E pronto, foi ver onde ele estava. Ele olhou-a sorridente como se já a conhecesse há muito tempo e começaram a andar os dois, um atrás do outro, sem muitas palavras talvez por não sentirem necessidade de as dizer. Mas a Vanessa também não era dali e no dia seguinte não apareceu. Foi assim que se começou a formar a segunda paixão do fogueteiro. Durante um mês, todos os domingos vinha estoirar três foguetes naquela terrinha com a esperança de que um dia a sua nova paixão se tornasse mais real. Toda a gente achava aquilo muito estranho, mas ele tinha razão porque um dia o milagre aconteceu, uma paixão atraiu a outra. Chegou a pensar que o seu amor à arte dos foguetes iria diminuir, mas não, as duas artes no amar continuaram a crescer em simultâneo sem que a mais recente definhasse a anterior. Todavia as paixões têm muitas faces e, passado algum tempo, revelou-se uma face cruel. As muitas solicitações de fogo exigiam mais horas de trabalho, e o excesso de trabalho reduzia os cálculos dos riscos. E foi assim que um dia o barracão onde se fabricavam os foguetes explodiu não deixando quase vestígios de nada nem de ninguém. O vestígio mais notório era o do amor, mas esse não era facilmente visível aos olhares perplexos dos cidadãos locais.

       Ao pensar nesta história que me foi próxima lembrei-me de uma leitura de Lucas no capítulo 13: “Ora, naquele tempo, estavam presentes alguns que lhe falavam dos galileus cujo sangue Pilatos misturara com os sacrifícios deles. Respondeu-lhes Jesus: Pensais que esses foram mais pecadores do que todos os galileus, por terem padecido tais coisas? Não, eu vos digo; antes, se não vos arrependerdes, todos de igual modo perecereis. Ou pensais que aqueles dezoito, sobre os quais caiu a torre de Siloé e os matou, foram mais culpados do que todos os outros habitantes de Jerusalém? Não, eu vos digo; antes, se não vos arrependerdes, todos de igual modo perecereis”. Pilatos, o político cruel, agia com a fórmula da “paz romana”: quem se rebelar contra Roma, morre. Por isso, os galileus tão cruelmente assassinados poderão ter sido rebeldes contra o império invasor. Por seu lado, os que levaram com a torre em cima parece que estavam simplesmente no lugar errado à hora errada ou com cálculos errados. Nem uns nem outros sofreram um castigo por serem pecadores. Como resultado das suas acções ou por acidente, foram apenas vítimas de acontecimentos adversos. As opiniões acerca do amor entre o Almerindo e a Vanessa também eram controversas. Mas algumas eram bastante sensatas: então, se eles gostam um do outro e isso não faz mal a ninguém, alguém tem alguma coisa a ver com isso? Ainda bem que havia estas opiniões e que temos por defesa esta leitura de Lucas, senão não faltaria quem dissesse que o fogueteiro apaixonado tinha morrido por ser pecador nas suas paixões. Assim sabemos que não foi, nem por amar apaixonadamente o seu ofício de fogueteiro, nem por arder em chamas de amor pela sua amada. Aconteceu. Mas há coisas que nunca poderão ser apagadas da história, ou pelo menos daquele livro a que chamam da vida. Se o coração dos galileus ainda hoje bate em toda a parte onde se luta pela dignidade de um povo, os foguetes que o Almerindo estoirou em dias de nada continuam a ser o símbolo de corações que não se aguentam a bater sozinhos.

       Frei Matias, O.P.

      21.09.2013

A pope for the Catholic middle; countdown to the G-8


Having spent the early part of this week in Australia and New Zealand, I'm arriving today in Rome, where the buzz is about Pope Francis' blockbuster interview with 16 Jesuit publications around the world, including America magazine in the United States, in which he pointedly rejects a church of what he calls "small-minded rules."


In political terms, Francis says something out loud that arguably had already become clear, but with a degree of candor that popes don't often provide: "I have never been a right-winger."

At the level of content, there's not much groundbreaking in the interview with respect to his hour-and-20-minute press conference aboard the papal plane July 28. He offers the same blend of traditional doctrine with a deep emphasis on mercy, stressing that the church needs to be more pastoral and less judgmental in engaging questions such as abortion, homosexuality and women.
 

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Entrevista Exclusiva do Papa Francisco às revistas dos Jesuítas

  
Santa Marta, segunda-feira, 19 de Agosto, às 9.50

É segunda-feira, 19 de agosto. O Papa Francisco marcou encontro para as 10.00 na Casa de Santa Marta. Eu, no entanto, herdei do meu pai a necessidade de chegar sempre mais cedo. As pessoas que me acolhem instalam-me numa pequena sala. A espera dura pouco, e, depois de uns breves minutos, acompanham-me ao elevador. Nesses dois minutos tive tempo de recordar como em Lisboa, numa reunião de directores de algumas revistas da Companhia de Jesus, surgiu a proposta de publicar conjuntamente uma entrevista ao Papa. Tinha conversado com os outros directores, ensaiando algumas perguntas que exprimissem os interesses de todos. Saio do elevador e vejo o Papa já à porta, à minha espera. Na verdade, tive a agradável impressão de não ter atravessado portas.

Entro no seu quarto e o Papa convida-me a sentar numa poltrona. Ele senta-se numa cadeira mais alta e rígida, por causa dos seus problemas de coluna. O ambiente é simples, austero. O espaço de trabalho da escrivaninha é pequeno. Toca-me a essencialidade não apenas dos móveis, mas também das coisas. Vêem-se poucos livros, poucos papéis, poucos objectos. Entre estes, um ícone de São Francisco, uma estátua de Nossa Senhora de Luján (padroeira da Argentina), um crucifixo e uma estátua de São José adormecido, muito semelhante àquela que tinha visto no seu quarto de reitor e superior provincial no Colégio Máximo de San Miguel. A espiritualidade de Bergoglio não é feita de «energias harmonizadas», como ele lhe chamaria, mas de rostos humanos: Cristo, São Francisco, São José, Maria.

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20 setembro 2013

E-mail enviado ao Cardeal Marx, em 15 de Setembro de 2013, pelo NSI-Portugal

E-mail enviado ao Cardeal Marx, em 15 de Setembro de 2013, pelo NSI-Portugal, integrado numa iniciativa do IMWAC e de diversos movimentos católicos reformistas europeus.

O Cardeal Marx pertence ao grupo dos 8 Cardeais que irá apresentar ao Papa Francisco o projecto de reforma, tendo no seu âmbito a Europa.

Dear Cardinal Marx,

The 'We are Church' Movement in Portugal is very hopeful about the will being expressed by Pope Francis and other Church authorities to move forward with a profound reform of the Curia in order that our Church should better follow the challenge that Jesus laid before all humanity - to love others as we love ourselves, and to love God above everything else.  

We feel that your 2013 October Meeting is of the utmost importance to the future of the Roman Catholic Church and will be a first step in the structural reform of the whole Roman Catholic Church.

We sincerely hope that the Reform commission will listen to and work with bishops’ conferences across the world, as well as with religious orders and, of course, with the great majority of the members of the Church, that is to say the women, men and children who every day give witness to their Christian faith.

It is important that the much needed reform not only increases the efficacy of the Curia but helps the spirit of transparency; so that collegial plurality and democratic structures in the institutional Church have a chance to develop (e.g. ‘separation of powers’: independence of legislature, executive and judiciary). Women, who constitute more than half of the church members, are hardly ever represented or involved in decision making. New structures of communication and leadership have to be developed. They should correspond with the demands of the Gospel and meet the requirements of a worldwide net of communities of the faithful in different cultural settings.

The We Are Church movement believes that key decisions must be about:

1.     Decentralization of decision-making in the church and the giving of more rights  and responsibility to  the Church at local levels

2.     Representation in Rome of all churches in the world

3.     Emancipation of women at all levels

4.     Collegial responsibility and the abandonment of absolutist and        monarchical structures

5.     The implementation of human rights in the Church

6.     A code of behaviour, including accountability of church leaders to the people of God. 

Thanking you very much for all your efforts, please be assured we will keep you in our prayers,

We are Church Group - Portugal





 

07 setembro 2013

Francisco: 4. sobre temas em debate

     
Sobre a lei do celibato dos padres, sobre a ordenação das mulheres, sobre a comunhão dos divorciados recasados, sobre o preservativo, sobre o casamento homossexual, sobre o aborto, sobre a eutanásia, o que pensa o Papa Francisco?

"O problema moral do aborto é de natureza pré-religiosa, porque no momento da concepção reside o código genético da pessoa. Já ali se encontra um ser humano. Separo o tema do aborto de qualquer concepção religiosa. É um problema científico." "A vida humana deve ser defendida sempre desde a concepção."

Quanto ao preservativo, não ignorará que Bento XVI já abrira a porta, pelo menos em certos casos.

 Sobre o celibato sabe por experiência própria. Quando era seminarista, ficou deslumbrado por uma rapariga. "Surpreendeu-me a sua beleza, a sua luz intelectual... e, bom, andei baralhado durante algum tempo, a dar voltas à cabeça." Ainda era livre, porque era seminarista. Teve de repensar a sua escolha.

"Voltei a escolher o caminho religioso - ou a deixar que ele me escolhesse. Seria estranho que não se passasse este tipo de coisas." Quando aparece um padre a dizer que engravidou uma mulher, "ouço-o, procuro transmitir-lhe paz e aos poucos faço-o perceber que o direito natural é anterior ao seu direito como padre". No catolicismo ocidental (no Oriente, os padres podem casar-se), "o tema está a ser discutido", mas "por enquanto mantém-se firme a disciplina do celibato". "Trata-se de uma questão de disciplina, não de fé. É possível mudar."

Quanto à mulher na Igreja, "pensem: a Virgem é mais importante do que os apóstolos", "a mulher na Igreja é mais importante do que os bispos e os padres", "é necessária uma profunda teologia da mulher". Mas, "quanto à ordenação das mulheres, a Igreja falou e diz não. Disse-o João Paulo II, com uma formulação definitiva. Essa porta está fechada".

 

Quanto à comunhão das pessoas que voltaram a casar-se, é preciso pensar que a Igreja é mãe e misericórdia e "creio que o problema deve ser estudado no quadro da pastoral matrimonial." Não esquecer que a Igreja ortodoxa tem uma práxis diferente, "dá uma segunda possibilidade."

Sobre o lobby gay no Vaticano. "Quando nos encontramos com uma pessoa assim, deve-se distinguir entre o facto de ser gay e o facto de fazer lobby, porque nenhum lobby é bom. Se uma pessoa é gay e procura o Senhor e tem boa vontade, quem sou eu para julgar?" O Catecismo da Igreja Católica "explica isto de forma muito boa: não se deve marginalizar estas pessoas. É preciso integrá-las na sociedade. O problema não é ter esta tendência. Devemos ser irmãos. O problema é fazer lobby. Lobby desta tendência ou lobby dos avaros, dos políticos, dos maçons".

Ainda cardeal, sobre o casamento homossexual. "Sabemos que, em tempos de mudanças históricas, o fenómeno da homossexualidade aumentava. No entanto, no nosso tempo, é a primeira vez que se levanta o problema jurídico de a associar ao casamento, o que considero uma menos valia e um recuo antropológico. Digo-o, porque esta questão ultrapassa o plano religioso, é antropológica. Quando o chefe do Governo da cidade de Buenos Aires, Mauricio Macri, não apelou da sentença de uma juíza de primeira instância autorizando o casamento, senti que tinha algo a dizer, e, como forma de orientação, senti-me obrigado a manifestar a minha opinião. Foi a primeira vez em 18 anos de bispo que fiz uma crítica a um funcionário. Em momento algum falei depreciativamente dos homossexuais, mas intervim apontando uma questão legal." "Se houver uma união de tipo privado, não há um terceiro ou uma sociedade que sejam afectados. Ora, se dermos à homossexualidade a categoria matrimonial, os homossexuais ficam habilitados à adopção, e poderá haver crianças afectadas. Qualquer pessoa precisa de um pai masculino e de uma mãe feminina que ajudem a representar a sua identidade."

Quanto à eutanásia, é preciso distingui-la da obstinação terapêutica. "As pessoas não são obrigadas a conservar a vida através de cuidados extraordinários. Isso pode ir contra a dignidade do indivíduo. Diferente é a eutanásia activa; esta é equivalente a matar."
 
ANSELMO BORGES 7 de Setembro de 2013 17 comentários
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O que pensa Francisco: 3. sobre as religiões


Qual é o determinante da religião, de tal modo que se pode garantir que ela vai ter sempre futuro? "Quando queremos ser sensatos, sinceros com aquilo que sentimos, manifesta--se uma inquietação profunda face ao Transcendente." Essa inquietação, que é "inerente à natureza humana", "chega mesmo a aparecer em pessoas que não ouviram falar de Deus ou que tiveram nas suas vidas posições antirreligiosas ou imanentistas e que, de repente, se deparam com algo que as transcendeu. Enquanto essa inquietação existir, existirá a religião, haverá formas de religação a Deus". A religião autêntica está em busca permanente. Por isso, uma religião puramente ritualista está destinada a morrer: enche-nos de ritos, mas "deixa--nos um vazio no coração".
A procura religiosa não terminou, continua forte, também em movimentos populares de piedade, "maneiras de viver o religioso de forma popular". O que está é "um pouco desorientada, fora das estruturas institucionais". O desafio maior para os líderes religiosos é o de "uma atracção através do testemunho", excluindo o proselitismo. É preciso procurar a autenticidade, mas, "quando isso significa apenas o prescritivo, cumprir regras, cai-se num purismo que também não é religioso".
Porque há várias religiões? "Deus faz-se sentir no coração de cada pessoa. Também respeita a cultura dos povos. Cada povo vai captando essa visão de Deus, tradu-la de acordo com a cultura que tem e vai elaborando, purificando, vai-lhe dando um sistema."
A relação religiosa autêntica implica um compromisso: "É necessário envolvermo-nos no mundo, mas sempre com base na experiência religiosa", evitando o risco de "agir como uma ONG". Quem acredita em Deus tem, nessa experiência, uma missão de justiça para com os seus irmãos, "uma justiça criativa, porque inventa coisas: educação, promoção social, cuidados, alívio, etc."
A fé tem de dialogar com a cultura. Mais: deve "criar cultura", uma cultura diferente das "culturas idólatras" da nossa sociedade: "o consumismo, o relativismo e o hedonismo são exemplo disso". "Uma fé que não se torna cultura não é uma verdadeira fé." Também dialoga - Bergoglio é químico - com a ciência, que, "dentro da sua autonomia, vai transformando incultura em cultura", devendo estar atenta, pois "a sua própria criação pode escapar-lhe das mãos".
A globalização a defender tem de ser "como a figura de um poliedro, onde todos se integram, mas cada um mantém a sua peculiaridade, que, por sua vez, vai enriquecendo os outros". "A globalização que uniformiza é essencialmente imperialista e instrumentalmente liberal, mas não é humana."
Defende o Estado laico: "A convivência pacífica entre as diferentes religiões vê-se beneficiada pela laicidade do Estado, que, sem assumir como própria nenhuma posição confessional, respeita e valoriza a presença do factor religioso na sociedade."
Apontou o ecumenismo como uma das prioridades do seu pontificado: "Desejo assegurar a minha vontade firme de prosseguir com o diálogo ecuménico." Continuará igualmente o diálogo inter-religioso: "A Igreja Católica é consciente da impor-tância que tem a promoção da amizade e do respeito entre homens e mulheres de diferentes tradições religiosas. Quero repetir: promoção da amizade e do respeito entre homens e mulheres de diferentes tradições religiosas." Como sinal disso, enviou uma mensagem pessoal aos muçulmanos, por ocasião do fim do Ramadão, advogando "o respeito mútuo", pondo fim às "críticas e difamações" por parte das duas religiões.
 O diálogo é activo e exerce-se de múltiplos modos. A Igreja Católica "também é consciente da responsabilidade de todos pelo nosso mundo, pela criação inteira, que devemos amar e guardar. E podemos fazer muito pelo bem dos mais pobres, dos mais débeis, dos que sofrem, para promover a justiça e a reconciliação, para construir a paz. Mas, acima de tudo, devemos manter viva no mundo a sede de absoluto, não permitindo que prevaleça uma visão da pessoa humana unidimensional, segundo a qual o ser humano se reduz ao que produz e ao que consome: trata-se de uma das ciladas mais perigosas do nosso tempo".

ANSELMO BORGES 31 agosto 2013 143 comentários
in DN