30 junho 2019


P / INFO: Crónicas & En primicia el Papa en Televisa: “El mundo sin la mujer no funciona”. Entrevista del Papa Francisco con Valentina Alazraki para el medio de comunicación mexicano Televisa.
NOTA: Esta importante entrevista é muito longa pelo que optei por mandar em anexo
Frei Bento – Espiritualidade, mas que espiritualidade?
Padre Anselmo - Confissões do Papa Francisco. 1 
Padre Tolentino - A cicatriz
Padre Vítor – Caminho novo
ESPIRITUALIDADE, MAS QUE ESPIRITUALIDADE?
Frei Bento Domingues, O.P.
Quem anuncia um curso de teologia não pode esperar grande adesão, mas se propõe um curso sobre uma espiritualidade desconhecida terá aos seus pés um mundo de curiosos de todas as novidades esotéricas.
1. Será verdade que, no Ocidente, as religiões com os seus dogmas, catecismos, normas morais, esgotaram o prestígio que lhes atribuíram ao longo dos séculos? Ou será apenas a violência, em nome de Deus, que as desacreditou? Seja como for, a religião ganhou às religiões, a religiosidade ganhou à religião, a espiritualidade parece ganhar à religiosidade. O mercado das espiritualidades ganhou ao das religiões a la carte. As espiritualidades e sabedorias do Oriente tiveram um acolhimento inesperado no Ocidente. Mesmo no campo católico, repete-se que o século XXI ou se torna místico ou está perdido.
Quem anuncia um curso de teologia não pode esperar grande adesão, mas se propõe um curso sobre uma espiritualidade desconhecida, e quanto mais desconhecida melhor, terá aos seus pés um mundo de curiosos de todas as novidades esotéricas.
Existem sabedorias e espiritualidades que não estão ligadas a nenhuma confissão religiosa, mas constituem campos de busca de sentido existencial.
Este Papa encerrou uma época, muito recente, confiada aos Prefeitos da Congregação para a Doutrina da Fé, perfeitos em silenciar a liberdade no seio da Igreja.
Ele próprio não tem boas recordações da teologia que teve de frequentar como estudante, uma teologia de manuais, onde estavam previstas e congeladas as teses, as perguntas e as respostas. Desde a Alegria do Evangelho que sonha com «Faculdades de Teologia onde se viva a convivialidade das diferenças, onde se pratique uma teologia do diálogo e do acolhimento; onde se experimente o modelo do poliedro do saber teológico, em vez de uma esfera estática e desencarnada. Onde a investigação teológica seja capaz de se comprometer com um cativante processo de inculturação».
Está convencido que tanto «os bons teólogos, como os bons pastores, têm o cheiro do povo e da estrada e, com a sua reflexão, derramam óleo e vinho sobre as feridas dos homens». Para ele, a teologia deve ser «a expressão de uma Igreja que é um “hospital de campanha”, que vive a sua missão de salvação e de cura no mundo! A misericórdia não é só uma atitude pastoral, é a própria substância do Evangelho de Jesus».
2. O Papa Francisco incita os professores de teologia a que a centralidade da misericórdia se exprima nas várias disciplinas: na dogmática, na moral, na espiritualidade, no direito e assim por diante. «Sem misericórdia, a nossa teologia, o nosso direito, a nossa pastoral, correm o risco de se afundarem na mesquinhez burocrática ou na ideologia que, por natureza, quer domesticar o mistério».
Defende uma teologia do acolhimento que desenvolva «um diálogo sincero com as instituições sociais e civis, com os centros universitários e de investigação, com os líderes religiosos e com todas as mulheres e homens de boa vontade». A construção na paz de uma sociedade inclusiva e fraterna, assim como a protecção da criação, exige a colaboração de todos.
Está convencido de que este modo de proceder dialógico é a via para chegar até onde se formam os paradigmas, os modos de sentir, os símbolos, as representações das pessoas e dos povos. Importa «chegar até esse ponto – como “etnógrafos espirituais” da alma do povo, digamos assim – para poder dialogar em profundidade e, se possível, contribuir para o seu desenvolvimento». É fruto do anúncio do Evangelho do Reino de Deus o amadurecimento de uma fraternidade cada vez mais dilatada e inclusiva.
Nada disto é possível sem liberdade teológica. «Sem a possibilidade de experimentar estradas novas, não se cria nada de novo, e não se dá espaço à novidade do Espírito do Ressuscitado». A quem sonha com uma doutrina monolítica a ser defendida por todos, sem nuances, isto não lhe sabe bem. No entanto, é «essa variedade que ajuda a manifestar e a desenvolver melhor os diversos aspectos da riqueza inesgotável do Evangelho[1]». Para conseguir este objectivo, é preciso uma revisão adequada da ratio studiorum.
Sobre a liberdade de reflexão, o Papa observa: entre os estudiosos, é preciso avançar com liberdade; depois, em última instância, será o magistério a dizer alguma coisa, mas não se pode fazer uma teologia sem esta liberdade. Na pregação ao Povo de Deus, porém, não se deve ferir a sua fé com questões disputadas. Estas que fiquem entre os teólogos. É a sua tarefa. Ao Povo de Deus é preciso dar a substância que alimente a fé e que não a relativize.
O Papa não está a embarcar numa onda de espiritualismo fácil. Sublinha, pelo contrário, que o “discernimento espiritual” não exclui os contributos de sabedorias humanas, existenciais, psicológicas, sociológicas ou morais, mas transcende-as. «Nem sequer bastam as normas sábias da Igreja. Lembremo-nos sempre de que o discernimento é uma graça. Em suma, o discernimento leva à própria fonte da vida que não morre, isto é, conhecer o Pai, o único Deus verdadeiro, e a quem Ele enviou, Jesus Cristo[2]».
Uma teologia tão alerta só pode gerar uma espiritualidade de olhos bem abertos.
3. A dimensão espiritual, afirmada ou negada, está presente em todas as situações da vida. Como escreve o poeta Carlos Drummond de Andrade: Para isso fomos feitos/ para lembrar e ser lembrados/ para chorar e fazer chorar/ para enterrar os nossos mortos/ para isso temos braços longos para os adeuses/ mãos para colher o que foi dado/ dedos para cavar a terra/ (…) Fomos feitos para a esperança do milagre/ para a participação da poesia/ para ver a face da morte/ de repente nunca mais esperaremos/ hoje a noite é jovem; da morte/ apenas nascemos, imensamente.
Parece que os poetas não acreditam que a vida será regida apenas por super-computadores electrónicos[3]. Também não espero que um dia vá surgir, como pensava Jean Rostand, pílulas (tão obrigatórias como aprender a ler) destinadas a moderar a inveja, a dominar a ambição, a reduzir o desejo de poder, da força, da violência, de predomínio (as verdadeiras calamidades históricas) impondo aos seres humanos um sentido universal de solidariedade.
Isto seria um milagre: o homem tornar-se-ia humano através de um equilíbrio biológico sabiamente conseguido pela química[4]. Mas que teria isso a ver com um ser humano?
in Público 30.06.2019
https://www.publico.pt/2019/06/30/sociedade/opiniao/espiritualidade-espiritualidade-1878053


[1] Evangelii gaudium, 40
[2] Gaudete et exsultate, 170; para todas as questões, desta crónica, relativas à teologia, ver: Papa Francisco, na Pontifícia Faculdade de Teologia da Itália Meridional, Nápoles, 21.6.2019.
[3] São cada vez mais espantosos os benefícios da inteligência artificial, assim como as esperanças e os receios que semeiam. Cf. Arlindo Oliveira, Inteligência artificial, Fund. Francisco Manuel dos Santos, 2019. Ainda não conheço os poemas dessa famosa inteligência.
[4] Cf. Chianca de Garcia, Cartas do Brasil, Edição O Independente, Lisboa, 2004, 19. 23. 132-133

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Confissões do Papa Francisco. 1
Anselmo Borges
Padre e professor de Filosofia

1. “O que está em crise são estruturas que formam a Igreja, que têm de cair. Sejamos conscientes. O Estado da Cidade do Vaticano como forma de governo, a Cúria, seja o que for, é a última corte europeia de uma monarquia absoluta. A última. As outras já são monarquias constitucionais, a corte dilui-se, mas aqui há estruturas de corte que são o que tem de cair.” “A reforma não é minha. Foram os cardeais que a pediram”, quando se debatia a sucessão de Bento XVI.
Quem disse isto foi o Papa Francisco numa extensa entrevista à jornalista Valentina Alazraki, de Noticieros Televisa, México. Os temas debatidos, num imenso à-vontade, mesmo quando difíceis e até escaldantes, foram muitos.
2. O que aí fica quer ser um brevíssimo resumo desse longo diálogo leal, onde não faltou o bom humor.
2. 1. Um tema constante nas preocupações de Francisco: os migrantes e refugiados. Não se pode pretender resolver os problemas erguendo muros, como se “essa fosse a defesa. A defesa é o diálogo, o crescimento, o acolhimento e a educação, a integração ou o limite saudável do ‘não é possível acolher  mais’, saudável e humano.” Referindo-se a Trump, disse: “Pode-se defender o território com uma ponte, não com um muro.”
2. 2. Algo não funciona em relação à economia, que se tornou sobretudo economia da especulação financeira: “Já saímos do mundo da economia, estamos no mundo das finanças. Onde as finanças são gasosas. O concreto da riqueza num mundo de finanças é mínimo.” Então, o mal-estar provém desta constatação: “Cada vez há menos ricos, menos ricos com a maior parte da riqueza do mundo. E cada vez há mais pobres com menos do mínimo para viver.”
Francisco pronuncia-se contra uma economia neoliberal de mercado. É favorável a “uma economia social de mercado”.
Aqui, eu acrescentaria: economia social e ecológica de mercado e chamaria a atenção para as tremendas, se não insuperáveis, dificuldades para impô-la, apesar da sua urgência em ordem à sobrevivência. Porquê? Num mundo globalizado, os mercados são globais, mas a política é nacional ou regional. Nesta situação, onde estão as instâncias de regulação dos mercados? Francisco sabe disso e, por isso, acrescenta que é necessário “procurar saídas políticas, eu não as sei dizer, porque não sou político. Não tenho esse ofício. Mas a política é criativa. Não nos esqueçamos que é uma das formas mais altas da caridade, do amor, do amor social.”
Em conexão e interdependência com este mal-estar global da economia está “o maltrato do ambiente”. Francisco tem sido incansável no apelo a uma nova política para a salvaguarda do ambiente, se quisermos ter futuro. E até pergunta: será que ainda vamos a tempo de salvar “a nossa casa comum”? Sobre a ameaça do colapso ecológico, escreveu uma encíclica, Laudato Sí,  que fica para a História como decisiva, propugnando o que chamou justamente “uma ecologia integral”. Neste sentido, o Vaticano acaba de avançar com uma iniciativa ecuménica global de oração e de acção precisamente em ordem à protecção desta nossa casa comum: durante um mês, de 1 de Setembro a 4 de Outubro, chamado o mês do “Tempo da Criação”, os cristãos de todo o mundo são convocados para pôr em prática a Laudato Sí.
2. 3. Sobre o narcotráfico: “É como se eu, para ajudar a evangelização de um país, fizesse um pacto com o diabo..., ou seja, há pactos que não se podem fazer.”
2. 4. Os jovens? “Os jovens não estão corrompidos. Estão debilitados.” “A juventude corre o risco de, se é que o não fez já, perder as raízes.” E cita Zygmund Bauman, num livro escrito em italiano com um seu assistente italiano, com o título: Nati liquidi, nascidos líquidos, isto é, sem consistência. No alemão apareceu com o título: Die Entwurzelten, os desenraizados, os sem raízes. “Os alemães perceberam a mensagem do livro. Isso é muito importante hoje: ir às raízes”, o que nada tem a ver com “ideologia conservadora.” “Assumir as raízes normais, as raízes da tua casa, as raízes da tua pátria, da tua cidade, da tua história, do teu povo..., de ... mil coisas.” Por isso, acrescenta: “Eu aconselho sempre os jovens a falar com os velhos e os velhos a falar com os jovens, porque... uma árvore não pode crescer, se lhe cortarmos as raízes, como também não cresce, se ficarem só as raízes.”
2. 5. As mulheres? Reconhece que a mulher “está ainda em segundo lugar... em segundo lugar.” Mas “sem a mulher, o mundo não funciona. Não por ser ela que gera os filhos, deixemos a procriação de lado... Uma casa sem a mulher não funciona.” Há uma palavra que está a desaparecer dos dicionários, porque “todos têm medo dela: ternura. É património da mulher. Daí ao feminicídio, à escravidão, vai um passo, não? Qual é o ódio, eu não saberia explicar. Talvez algum antropólogo o possa fazer.”
Aqui, o Papa Francisco que me desculpe, mas vou fazer um reparo. E na Igreja? Ele vai repetindo que “a Igreja é feminina” e já na viagem ao Brasil avisou: “Se a Igreja perde as mulheres, na sua dimensão total e real, corre o risco de se tornar estéril.” Então, porquê tanta hesitação em ordenar as mulheres como diáconos? Esse seria um primeiro passo da abertura que se impõe.
Francisco insiste na Igreja sinodal e essa ordenação deverá, tudo indica, acontecer já na sequência do próximo Sínodo para a Amazónia, em Outubro.
2. 6. Sobre os escândalos da pedofilia na Igreja. Aqui, Francisco reconhece que também se equivoca. Equivocou-se nomeadamente no que à questão da pedofilia no Chile se refere. E foram concretamente perguntas dos jornalistas, “feitas com muita educação” no regresso da viagem ao Chile,  que o fizeram perceber que a informação que tinha não era verdadeira. Estava mal informado. E não exclui que tenha havido corrupção na informação prestada: “Nem sempre é corrupção assim... por vezes é estilo da Cúria — sim, no fundo há uma lei de corrupção —, mas é um estilo que é preciso ajudar a corrigir.”
Concretamente quanto ao cardeal McCarrick, a quem acabou por retirar o cardinalato e reduzir ao estado laical, confessa: “De Mc Carrick eu não sabia nada, obviamente, nada, nada.” “O cardeal Pell obviamente que está preso e está condenado, apelou, mas está condenado. O cardeal Errázuriz já não podia continuar, era óbvio”. Conclusão: o grupo de cardeais consultores começou por ser constituído por nove e agora são seis. Quanto às acusações que o ex-Núncio Viganò lhe fez, respondeu, explicando o seu silêncio na altura: “Eu confio na honestidade dos jornalistas e disse-vos: ‘Estudai vós a questão e tirai as conclusões.’ E o trabalho que fizestes foi genial, e três ou quatro meses depois um juiz de Milão condenou-o.”
Mas, indo ao cerne dessa chaga que é a pedofilia na Igreja, concluiu que, com as medidas concretas que estão a ser tomadas, a “tolerância zero” é mesmo para implementar, salvaguardando também o princípio da presunção de inocência: “A tarefa do padre é levar o jovem a Jesus. Com os abusos, sepulta-o. Essa é a grande monstruosidade. Que é mais grave que tudo o resto.” Mas não se pode ignorar os números aterradores de casos de pedofilia no mundo, a maior parte na família, também entre educadores, no desporto, etc., que apresentou no discurso final da Cimeira no Vaticano contra os abusos na Igreja, em Fevereiro passado. “Evidentemente, a percentagem de sacerdotes que caíram nisto faz parte do todo, uma corrupção mundial na pedofilia, é de terror... E por isso quis que todos tivessem as estatísticas da Unicef, das Nações Unidas, as mais sérias, as estatísticas sérias.” “Seria importante aqui referir os dados gerais — na minha opinião, sempre parciais — a nível global e a seguir a nível da Europa, da Ásia, das Américas, da África e da Oceânia, para dar um quadro da gravidade e profundidade deste flagelo nas nossas sociedades. A primeira verdade que resulta dos dados disponíveis é esta: quem comete os abusos, ou seja, as violências (físicas, sexuais ou emocionais) são sobretudo os pais, os parentes, os maridos de esposas-meninas, os treinadores e os educadores. Além disso, segundo os dados Unicef de 2017, relativos a 28 países no mundo, em cada 10 meninas-adolescentes que tiveram relações sexuais forçadas, 9 revelam que foram vítimas de uma pessoa conhecida ou próxima da família.” Um número aterrador, a título de exemplo, no nível global: “Em 2017, a OMS estimou em mil milhões os menores com idade entre os 2 e os 17 anos que sofreram violências ou negligências físicas, emocionais ou sexuais.” (Continua)
in DN, 30.06.2019
https://www.dn.pt/opiniao/opiniao-dn/anselmo-borges/interior/confissoes-do-papa-francisco-1-11061377.html 
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QUE COISA SÃO AS NUVENS
JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA
A Cicatriz
HÁ COISAS QUE SABEMOS QUE NOS DISTINGUEM E DISTINGUIRÃO COMO HUMANOS
Vi estes dias uma fotografia que me comoveu. Conta um episódio simples de uma família simples, do norte de Inglaterra. A fotografia mostra Martin Watts e o seu filho Joey, um miúdo de seis anos de idade, que teve recentemente de passar por uma complexa cirurgia cardíaca. Essa operação deixou no peito da criança uma cicatriz que mede bem um palmo. Quando a viu pela primeira vez, Joey perguntou aos pais se tinha sido ali que o cortaram para lhe consertarem o coração. Os pais explicaram que ele não devia ter medo, que ele era um pequeno grande lutador, que sentiam um orgulho enorme da sua bravura, e que aquela cicatriz simbolizava isso tudo. Mas, mesmo ao mais corajoso lutador, é difícil transportar as próprias feridas, e aos seis anos de idade os olhos desamparados de Joey gritavam isso. Poucos dias depois, Martin Watts — com a cumplicidade da mulher — decide fazer uma coisa que nunca lhe passara pela cabeça: uma tatuagem. Tatuaria no peito o desenho de uma cicatriz, idêntica à do filho. E, de facto, a tatuagem realizada reproduz, com grande realismo, o longo talho vertical avermelhado, em dupla costura, como se pode ver na fotografia em que ambos posam. Nela, o pai abraça o jovem filho convalescente, e o sorriso de um sustenta, protege e expande o sorriso do outro. O amor distingue-se por esta voluntária e interminável capacidade de tornar menos solitários os pesos, os golpes, os contratempos e as feridas com que a vida, em nós, se expressa. E, num tempo como o nosso, em que parece crescer uma incerteza em relação ao humano, e se debatem — como se fossem de todo indefinidas — a natureza e as fronteiras da nossa humanidade, é importante atender à irremovível verdade dos gestos elementares de amor que nos fundam para colhermos o significado disto que somos.
O amor distingue-se por esta capacidade de tornar menos solitários os pesos, os golpes e as feridas com que a vida, em nós, se expressa
Hoje, por exemplo, convivemos e interagimos com muitas máquinas: desde os velhos frigoríficos, aos computadores, aos telemóveis, às máquinas de multibanco, às portas automáticas ou aos drones. Existe um aparato tecnológico imenso integrado nos nossos quotidianos. Mas há um passo próximo, cada vez mais vizinho, que ocorrerá quando as máquinas forem programadas para interagir com os humanos pretensamente do mesmo modo como nós humanos nos relacionamos uns com os outros. Num jargão que força para se tornar língua comum, começa a falar-se dos robôs como “seres viventes não-biológicos” e avança-se experimentalmente para a chamada “robótica social”, com a reivindicação de que esta se desloque do âmbito da engenharia para o campo específico da sociabilidade humana. Não é preciso ser um especialista para perceber que há uma montanha de questões éticas a enfrentar. Mas é curioso como a “nova ecologia social mista” tenta dirimir as dúvidas fundamentais que qualquer um de nós se coloca. A começar por saber se é aceitável confiar pessoas em situação de vulnerabilidade — como crianças, idosos ou doentes — aos cuidados destes “agentes artificiais”, projetados não só para desempenhar meras ações técnicas, mas para criar também uma dependência emocional e afetiva de substituição. Os mais entusiastas falam de uma “empatia artificial”, argumentando que é certo que não se pode pedir (ainda) à máquina que tenha emoções, mas pode-se esperar que o agente artificial registe as emoções do seu interlocutor humano e adeqúe positivamente a sua resposta.

Diz-se que a última frase escrita por Fernando Pessoa terá sido: “I know not what tomorrow will bring.” Nesta encruzilhada epocal, todos podemos dizer o mesmo. Mas há coisas que sabemos que nos distinguem e distinguirão como humanos. Entre elas está a arte de reparar através do amor as cicatrizes mais irreparáveis.
in Semanário Expresso, 29.06.2019 p 160
https://leitor.expresso.pt/semanario/semanario2435/html/_index?p=/semanario/semanario2435/html
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À PROCURA DA PALAVRA
P. Vítor Gonçalves
DOMINGO XIII COMUM Ano C
“As raposas têm as suas tocas e as aves do céu os seus ninhos;
mas o Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça.”
Lc 9, 58
Caminho novo
Conheço cada vez mais pessoas que gostam de caminhar. Porque o médico recomendou, porque é bom fazer exercício físico, porque gostam de descobrir novas paisagens, porque saboreiam o silêncio e abrem os ouvidos para outros sons, porque caminham com outros, porque têm uma meta ou um santuário a alcançar. Há tantos caminhos quanto caminhantes. E cada caminho reclama despojamento, coragem e confiança. Pois quem procura comodidade e segurança, pode até viajar muito mas chegará sempre ao mesmo lugar.
Os evangelhos apresentam-nos Jesus sempre em caminho. Ao chamar os discípulos para “andarem com Ele” imaginariam eles as distâncias que iriam percorrer? Distâncias percorridas com os pés, e outras ainda maiores com a mente e o coração, no conhecimento de Deus e do seu projecto de amor. Nos encontros que tem com pecadores e doentes, pela palavra e pelos milagres, Jesus nunca ninguém deixa na mesma: “vai”, “levanta-te”; há sempre um futuro mais à frente e é preciso caminhar para ele. No caminho para Jerusalém, que ocupa grande parte do evangelho de S. Lucas, os discípulos aprendem lições fundamentais. Que serão para todos os que O quiserem seguir, ao longo dos tempos.
Nenhum caminho está feito à partida. Ainda que haja estradas ou trilhos, são os nossos passos, as pequenas e grandes escolhas de cada um e de cada comunidade que importam. Por isso, a decisão de partir é fundamental. Sabendo que haverá reais dificuldades. Umas por dentro: fadiga, desencanto, saudade do que se deixou. Outras por fora: rejeição, indiferença, perseguição. Logo na primeira etapa os discípulos descobrem que a rejeição acompanha Cristo e o Evangelho: uma aldeia de samaritanos recusa acolhê-los. Não será a violência o sinal dos seguidores de Cristo, mas a humildade.
Os três encontros de Jesus com “candidatos a discípulos” são também desconcertantes. Dois oferecem-se e um é chamado. Ao primeiro, Jesus aponta a confiança no Pai como condição fundamental para O seguir. Toda a instalação, pessoal e comunitária, tende a atrofiar as pernas e os sonhos. E acaba por aprisionar o pensamento, justificar rotinas vazias, limitar os horizontes. Mais do que as raposas e as aves, que nos parecem tão livres, somos chamados a uma liberdade maior. Ao segundo, Jesus propõe o novo sentido da vida que se liberta da morte. Não para desprezar o cuidado por quem faleceu, mas para não ficar preso a um luto que não vê mais além. O amor é a chave que abre um novo caminho. Ao terceiro, Jesus propõe a urgência do desapego. Olhar para trás quando se ara um terreno só produzirá linhas tortas.
Com Jesus percorremos sempre um caminho novo. De trás trazemos sabedoria. Haverá lugar na mente e no coração para o que vamos encontrar pela frente?

in Voz da verdade, 30.06.2019
http://www.vozdaverdade.org/site/index.php?id=8281&cont_=ver2

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En primicia el Papa en Televisa: “El mundo sin la mujer no funciona”
Entrevista del Papa Francisco con Valentina Alazraki para el medio de comunicación mexicano Televisa.

Algunos de los asuntos tratados: feminicidio, migraciones, el muro de Trump entre Estados Unidos y México, narcotráfico y abusos por parte de clérigos.

P: Papa Francisco, antes que nada, gracias. Sabemos que el presidente Andrés Manuel López Obrador lo invitó a México, tengo entendido de que no va a ir…
R: Por el momento no…
P: Pero que le ha dicho que con gusto le recibiría…
R: Es verdad. Por el momento tengo que ir a otros lados donde no he ido. Pero me gustaría volver a México, es inolvidable, México.
P: Bueno, usted fue…  en su viaje a México, usted tocó yo creo que realmente los puntos neurálgicos del país ¿no? Estuvo en la frontera norte, y celebró esa misa memorable frente al muro. Desafortunadamente Papa Francisco, en estos cuatro años la situación no ha mejorado nada…  Se sigue hablando de construir más muro, incluso de cerrar la frontera. Hemos visto imágenes desgarradoras de niños separados de sus familias, de sus papás, no sé si usted ha visto esas fotos, esos vídeos, son impresionantes. Yo no sé, me parece algo terrible y que no es digno de nuestros tiempos…
R: Si. Yo no sé qué sucede cuando entra esta nueva cultura de defender territorios haciendo muro ¿no? Ya conocimos uno, el de Berlín, que bastantes dolores de cabeza nos trajo y bastante sufrimiento…   Pero parece que lo que hace el hombre es lo que no hacen los animales ¿no? El hombre es el único animal que cae dos veces en el mismo hoyo ¿no? Volvemos a lo mismo ¿no? El levantar muros como si esa fuera la defensa ¿no? Cuando la defensa es el dialogo, el crecimiento, la acogida y la educación, la integración, o el sano límite del “no se puede más”, pero humano...  En esto no me refiero solo al límite de México, hablo de todas las barreras que hay. Me referí así, en una entrevista no hace mucho, a lo que hay en Ceuta y Melilla es terrible, con las concertinas. Después el gobierno las mando a sacar ¿no?… pero es cruel, es cruel. Y separar a los chicos de los padres va contra el derecho natural, y esos cristianos… no lo pueden ser tampoco. Es cruel. Se cae en la crueldad más grande.  Para defender ¿qué? El territorio, o la economía del país o vaya a saber qué ¿no? Pero son esquemas de pensamiento que se vuelcan al quehacer político, y hacen una política de ese tipo ¿no? Es muy triste ¿no?
P: Si en lugar de estar yo aquí, que usted me conoce, estuviera sentado el presidente Trump, y no hubiera cámaras, ¿qué le diría?
R: Lo mismo. Lo mismo, porque esto lo digo en público ¡eh! Lo he dicho en público. También dije en público que quien construye muros termina prisionero de los muros que construye...
https://www.vaticannews.va/es/papa/news/2019-05/papa-francisco-entrevista-televisa-mexico-migrantes-feminicidio.html

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23 junho 2019

P / INFO: Crónicas & Documento de trabalho para o Sínodo dos Bispos

HÁ BOAS NOTÍCIAS                          
Frei Bento Domingues, O.P.

1. Na última quinta-feira, a Igreja católica celebrou a festa do Corpo de Deus, feriado nacional. As origens desta festa estão envolvidas em histórias de muita fantasia. A chamada Lenda Rigaldina (séc. XIV) é a mais divertida. Estava Santo António a pregar, em Toulouse, sobre a presença real de Cristo sob as espécies do pão e do vinho, quando um ateu, chamado Bonillo, o enfrentou com um desafio: só acreditaria no que acabava de ouvir se a sua mula se ajoelhasse diante do ostensório eucarístico. Frei António aceitou e ampliou o desafio. Mandou que deixassem o animal sem comer três dias e, no final, lhe fosse apresentado um monte de erva e, ao lado, o ostensório.
No fim do terceiro dia, a mula esfomeada foi solta e, passando por um monte de feno e aveia, foi ajoelhar-se em frente da Custódia. Esta lenda deu origem a outra: uma freira agostiniana, Juliana de Mont Carnillon, terá conhecido ecos da pregação do Santo e teve visões de que era o próprio Cristo a manifestar-lhe o desejo de que o mistério da Eucaristia fosse celebrado com mais solenidade. Terá revelado esse desejo ao futuro Urbano IV. Entretanto, na cidade de Bolsena, perto de Orvieto, residência do Papa, aconteceu um espantoso milagre: um padre, ao celebrar a Eucaristia e ao partir a Hóstia consagrada, viu cair sobre a toalha gotas de sangue!
O Papa determinou que fossem levados para Orvieto, em grande procissão, os objectos envolvidos nesse prodígio, o que aconteceu a 19 de Junho de 1264. Terá sido esta a primeira procissão da festa Corpus Christi promulgada por Urbano IV.
De vários textos em concurso para a celebração da festa, foi preferido o de S. Tomás de Aquino. É uma grande peça poética e teológica de que faz parte o Tantum Ergo Sacramentum cantado até aos nossos dias.
A insistência na chamada presença real tornou-se um problema, sobretudo a partir do séc. XI, em resposta às negações do teólogo Berengário de Tours. História longa e complexa. Quando não se entende que não existe oposição entre presença simbólica e presença real, todos os equívocos são possíveis.
As narrativas sobre a Eucaristia evocam todas a Quinta-Feira Santa, que só a partir do séc. IV foi solenizada. São todas festas do Corpo de Deus, do Deus connosco, do Deus humanado.
O excesso de ritualização, no cristianismo, tende a esquecer o verdadeiro alcance dos seus símbolos fundadores. É o que passamos a procurar.
2. Este ano, os textos escolhidos para a celebração do Corpo de Deus, são dos mais antigos e dos mais provocadores para a nossa contemporaneidade, a nível local e global: a persistência das escandalosas desigualdades sociais e da fome, cuja erradicação é sempre anunciada para continuar sempre adiada. Que pode a missa contra isto?
Pelos vistos, é uma questão com a qual S. Paulo, no texto mais antigo sobre a Eucaristia, se viu confrontado[1]. Observou divisões sociais inaceitáveis na comunidade cristã de Corinto. Alguns serviam-se da própria reunião eucarística para exibir a sua superioridade económica e social. Levavam consigo boa comida e boa bebida que não partilhavam. S. Paulo fica indignado: será que não tendes casas para comer e beber ou vindes desprezar a Igreja de Deus e envergonhar aqueles que nada têm? Não esperem o meu louvor.
Vale sempre a pena regressar a um texto que ele próprio recebeu do Senhor e que, ainda hoje, é norma em todas as celebrações. Quando Jesus diz Isto é o meu corpo, evoca o sentido que deu a toda a sua vida e que deve ser o sentido da vida dos discípulos, de cada cristão: gastar suas energias para que todos tenham vida e vida em abundância. Nós, ao comungarmos, recebemos essa missão. Cada um tem de se examinar sobre o que pode fazer pelo bem dos mais marginalizados e marginalizadas.
Quando acrescenta: este cálice é a nova aliança no meu sangue, todas as vezes que o beberdes fazei-o em memória de mim, Jesus não estava a erguer um monumento à sua memória, como se tivesse receio de ser esquecido. O que ele procura é que o Evangelho seja continuado, que o seu percurso, pelo qual foi morto, não seja esquecido. A nova Aliança é o compromisso de Deus com as populações mais pobres, que não pode ser adulterado. Ao insistir, em memória de mim, é para não esquecermos a vida perigosa em que Jesus se envolveu: o caminho da fidelidade cristã, ao longo dos séculos, nas situações mais imprevisíveis.
Quem vai às celebrações eucarísticas sem este compromisso está a iludir-se: come e bebe a sua própria condenação. Uma Eucaristia é uma convocatória para alterar o rumo do mundo desumanizado e responsabilizar as Igrejas: como é possível missa após missa, rito após rito, continuar tudo na mesma?
O texto do Evangelho escolhido para essa celebração é uma parábola provocatória: os discípulos imaginam Jesus distraído. Falou e falou muito, mas fez-se tarde e parecia que Jesus não se apercebia da situação real. O melhor era que desse por encerrada a sessão e que cada um procurasse onde poderia ir comer. Tentaram descartar-se. Jesus intima-os: dai-lhes vós mesmos de comer[2]. Tinham pouco: 5 pães e 2 peixes para cinco mil pessoas? Jesus mostra uma lei universal. O que existe no mundo ou pode ser produzido, se for bem repartido, dá para todos e ainda sobra: é o sentido da parábola da multiplicação dos pães e dos peixes.
Não se pode pensar em partilha dos bens quando está tudo organizado para que os que têm, tenham cada vez mais e os que não têm fiquem ainda mais longe da mesa que deveria ser comum, o destino universal dos bens[3]. Como diz o Papa Francisco, cada vez há menos ricos, menos ricos com a maioria da fortuna do mundo. E cada vez há mais pobres com menos do mínimo para viver[4].
Quando celebramos a Eucaristia, a grande preocupação não pode ser, apenas, a de não faltarem hóstias para os fregueses. A pergunta é outra: desta Eucaristia vai sair gente empenhada em que a ninguém falte o pão, a casa e o trabalho? Quando Jesus diz isto é o meu corpo é também a esse corpo social que se refere.
3. Há duas boas notícias sobre a Eucaristia. No documento de trabalho para o Sínodo da Amazónia, está aberta a discussão sobre a ordenação de homens casados e a revisão dos ministérios das mulheres na Igreja. Este tabu acabou. Os sinos tocaram na Ribeira Seca e ela floriu. Não creio que Jesus Cristo estivesse de acordo com a suspensão a divinis, há 40 anos, do padre Martins Junior. Parece que o novo Bispo também não acreditou nisso.
23. Junho. 2019


[1] 1Cor 11, 16-34
[2] Lc 9, 11-17
[3] Discurso aos juízes do continente americano reunidos em congresso no Vaticano.
[4] Mensagem do Santo Padre Francisco para o III Dia Mundial dos Pobres (17 de Novembro de 2019).


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Fim da lei do celibato dos padres?
Anselmo Borges
Padre e Professor de Filosofia
1. A Igreja hierárquica, que viveu obcecada com o primado da moral sexual, é cada vez mais confrontada com os escândalos sexuais no seu próprio seio. Primeiro, foi a hecatombe da pedofilia. Mais recentemente, são as "namoradas" de padres que vêm denunciar os abusos de que foram ou são vítimas.
O Washington Post acaba de investigar o drama das mulheres que, sem qualquer apoio, foram obrigadas a viver amores clandestinos e a esconder e a criar sozinhas filhos das suas relações com padres. A Igreja vê-se agora confrontada com esses dramas de mulheres que sofreram a violência sexual, emocional e espiritual do clero. Pam Bond, por exemplo, hoje com 63 anos, contou ao Washington Post que teve em 1986 um filho de um padre franciscano a quem tinha recorrido pedindo ajuda para o seu casamento. "Assumo a responsabilidade pelos meus próprios erros, deveria ter sido suficientemente forte para me não colocar naquela situação", reconhece, mas também afirma que aquela relação não era plenamente consensual, pois havia uma diferença de poder entre o padre e ela.
Embora seja difícil estabelecer o número de casos no mundo, pensa-se que haverá milhares de mulheres nesta situação, vivendo uma relação sexual abusiva e com filhos mantidos em segredo. Há estudos que concluem que apenas 40% do clero pratica o celibato. Como já aqui dei conta, o sociólogo Javier Elzo, da Universidade jesuíta de Deusto, escreveu que 80%, se não mais, do clero africano, padres e bispos, têm uma vida sexual igual à dos outros africanos.
Evidentemente, toda esta situação exige reflexão profunda, incluindo o problema das comunidades cristãs que têm direito à celebração da Eucaristia e não o veem satisfeito por causa da falta do clero.
2. Hoje, os historiadores sérios não têm dúvidas de que Jesus foi celibatário. É pura "lenda de romance" pretender que Jesus foi casado com Maria Madalena, esclarecia ainda recentemente um dos maiores especialistas em cristianismo primitivo, Antonio Piñero, que não é crente, mas agnóstico. Mas Jesus não impôs a lei do celibato a ninguém. Mais: teve discípulos, como São Pedro, que eram casados. São Paulo foi igualmente celibatário, mas também não invocou essa lei; pelo contrário, pergunta na Primeira Carta aos Coríntios, 9, 5: "Não temos o direito de levar connosco, nas viagens, uma mulher cristã, como os restantes Apóstolos, os irmãos do Senhor e Cefas?" Na Primeira Carta a Timóteo, lê-se: "É necessário que o bispo seja irrepreensível, marido de uma só mulher, ponderado, de bons costumes, hospitaleiro, capaz de ensinar, que não seja dado ao vinho, nem violento, mas condescendente, pacífico, desinteressado, que governe bem a própria casa, mantendo os filhos submissos, com toda a dignidade. Pois, se alguém não sabe governar a própria casa, como cuidará ele da Igreja de Deus?" E a recomendação é repetida na Carta a Tito, 5-6: "Deixei-te em Creta, para acabares de organizar o que ainda falta e para colocares presbíteros (padres) em cada cidade, de acordo com as minhas instruções. Cada um deles deve ser irrepreensível, marido de uma só mulher, com filhos crentes, e não acusados de vida leviana ou de insubordinação."
Foi muito tarde que o celibato se foi impondo como lei: no século XI, com o Papa Gregório VII; no século XII, nos Concílios I e II de Latrão, em 1123 e 1139, respectivamente; mas só com o Concílio de Trento, no século XVI, se impôs a toda a Igreja do Ocidente, pois nas Igrejas católicas do Oriente é diferente.
3. Assim, vê-se claramente que o celibato enquanto lei não é um dogma. O próprio Papa Francisco já o reconheceu.
Pessoalmente, estou convicto de que será já no Sínodo sobre a Amazónia, a realizar em Roma em Outubro próximo, que assistiremos, com a ordenação de homens casados, ao fim da lei do celibato obrigatório para os padres.
Não sou o único com essa convicção. Há bispos alemães que alimentam a esperança de que neste Sínodo se operará uma "ruptura" e que, depois dele, "nada ficará como antes". Quem o diz é o bispo de Essen, Franz-Josef Overbeck. Também o vice-presidente da Conferência Episcopal Alemã, Franz-Josef Bode, manifestou a convicção de que o Sínodo trará grandes mudanças para a Igreja universal, esperando que o celibato para os padres seja "enriquecido com outras formas sacerdotais de vida", esclarecendo: "Eu poderia imaginar padres com famílias e trabalhos civis, como os actuais diáconos permanentes, alguns dos quais são casados e trabalham." "Devemos reconsiderar a conexão entre o celibato e o sacerdócio", advogando também o diaconado feminino "como sinal de reconhecimento, apreço e mudança de estatuto das mulheres na Igreja." Estes "padres com vocação civil" poderiam "celebrar a Eucaristia e realizar o correspondente ministério sacerdotal". O bispo Overbeck explicitou o seu pensamento, declarando que no Sínodo para a Amazónia serão debatidas muitas questões, como a moral sexual, o celibato obrigatório, o papel das mulheres na Igreja, a estrutura hierárquica da Igreja com o clericalismo, cada vez mais criticado como factor determinante na crise dos abusos de menores, sem esquecer outros temas igualmente fundamentais, como a "imensa exploração" do meio ambiente, as violações dos direitos humanos dos indígenas, o "eurocentrismo" da Igreja. Por causa da falta de clero, lembrou que muitas Igrejas locais na região começam a ser geridas por religiosas e observou: "O rosto da Igreja local é feminino."
No katholisch.de, reproduzindo o jornal Frankfurter Rundschau, podem ler-se as seguintes declarações do cardeal Walter Kasper, presidente emérito do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos e um dos teólogos que o Papa Francisco ouve com mais atenção, produzidas recentemente: Se precisamente no próximo Sínodo sobre a Amazónia, "os bispos concordassem em ordenar homens casados, o Papa, na minha opinião, aceitaria essa posição. O celibato não é um dogma, não é uma prática inalterável".
Isso não seria nada de extraordinário. De facto, no catolicismo de rito oriental, continua a ordenação de casados e os padres anglicanos casados que se convertem são aceites na Igreja católica na condição de casados. Mais importante: a lei do celibato, como ficou dito, não é um dogma de fé, mas uma medida disciplinar. O que é essencial é que as comunidades cristãs possam celebrar a Eucaristia, o que nem sempre acontece, e uma das causas é a exigência, que não provém do Evangelho, do celibato.
Confirmando o que aí fica, acaba de ser publicado o Instrumentum Laboris (intrumento de trabalho), que servirá de base aos debates durante o Sínodo para a Amazónia, que terá lugar no Vaticano, de 6 a 27 de Outubro próximo, onde se lê: estude-se a possibilidade da ordenação sacerdotal dos chamados "viri probati", isto é, homens de virtude comprovada, com maturidade humana e cristã, respeitados e aceites pela sua comunidade, "mesmo que já tenham uma família constituída e estável." Quanto às mulheres: "Identifique-se o tipo de ministério oficial que pode ser conferido à mulher, tendo em conta o papel central que hoje desempenham na Igreja amazónica."
in DN, 23.06.2019

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QUE COISA SÃO AS NUVENS
JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA
A VASSOURA
EM MOMENTOS DIFERENTES DA NOSSA VIDA, QUANDO NÃO É CLARO O QUE PODEMOS FAZER OU POR ONDE COMEÇAR, ESTENDAMOS A MÃO A UMA VASSOURA

Uma vez ouvi a um monge que o modo mais rápido de nos adaptarmos a uma nova situação é pegar numa vassoura. Ele contava com realismo que, ao longo da vida, tudo lhe custou: chegar a um mosteiro novo, encetar um novo ciclo, uma estação diferente, iniciar-se numa ulterior etapa do caminho. Mas que a vassoura (em modo literal ou figurado), mais do que qualquer outra coisa, foi a facilitadora indispensável em cada um desses momentos. Fiquei a pensar nisso. É uma importante aprendizagem a que nos faz preferir a vassoura à cadeira, à cela ou ao cetro. A vassoura tem um registo humilde, é verdade. E, não raro, desarma tanto as nossas expectativas e as idealizações de que partimos como as disposições bem arrumadas do protocolo social. Porém, o conhecimento que ela nos oferece é imediato, flagrante, concreto, focado no minúsculo, atento aos detalhes, colado ao espaço da existência e ao seu quotidiano ritmo. Podemos conhecer de muitas maneiras uma determinada realidade, mas nunca a conheceremos de forma tão certeira como aquela que nasce do investimento do nosso cuidado. Cuidar é, no fundo, aquilo que nos permite conhecer. Os planos que vamos urdindo de um ponto de vista mais teórico ou mais distanciado — como o exige, por exemplo, uma leitura crítica — têm seguramente a sua relevância e oportunidade, mas não podemos esquecer que, em si mesmos, são ainda mapas aproximativos. As ideias valem muito: não valem, contudo, só por si. Precisam daquela adequação que só a prova da aplicabilidade lhes traz. Contudo, uma relação mais plena, mais dialógica, mais incisiva tem início quando, num gesto mínimo como representa aquele de pegar numa vassoura, passamos de espectadores a atores. Há um saber que nos vem apenas pela entrega voluntária ao serviço.

As ideias valem muito: não valem, contudo, só por si. Precisam daquela adequação que só a prova da aplicabilidade lhes traz

Em momentos diferentes da nossa vida, quando não é claro o que podemos fazer ou por onde começar, estendamos a mão a uma vassoura. A vassoura vai sujar-nos as mãos e ensinar-nos, desse modo, uma imensidão de coisas às quais, de outra maneira, dificilmente acederíamos. O poeta Charles Péguy escreveu, com razão, que quando nos recusamos a sujar as mãos no cuidado da vida acabamos rapidamente por ficar sem mãos. É um facto: muitas vezes vivemos sem mãos, perdemos as nossas mãos lá atrás em alguma etapa do caminho, esquecemo-nos do seu significado, da sua função, e, por anos e anos, não temos consciência disso. A vassoura — e o que ela simboliza — realiza também um providencial movimento de resgate em relação a nós próprios. Na verdade, as mãos que se dão também se descobrem como mãos, como operadoras do dom, como protagonistas da história. As mãos que se dão escutam finalmente o seu idioma; compreendem que se cumprem não como afasia, mas como linguagem. Por isso, a vassoura tem tanta sabedoria a transmitir-nos: revela que o exercício prático do cuidado (a começar pelo cuidado ínfimo, elementar) nos permite, ao mesmo tempo, o conhecimento do ponto onde estamos no mundo e do ponto onde estamos em nós próprios.
Acontece-nos desistir de pensar na felicidade, porque a associamos, sob condição, a uma lista longa e desorbitada de fatores. O elenco dos ‘ses’ que vamos somando torna a felicidade inacessível e isso tem um preço: o de conformar a nossa visão com essa declaração de impossibilidade. Um passo importante ocorre, porém, quando temos a coragem de reajustar os nossos motivos de gratidão e de deslumbramento. Recordo-me de um poema antigo que diz: “Não posso ser mais feliz./ Vou buscar água ao poço./ E varro as folhas do meu pátio”.
in Semanário Expresso, 22.06.2019
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À PROCURA DA PALAVRA
P. Vítor Gonçalves
DOMINGO XII COMUM Ano C
“Se alguém quiser vir comigo, renuncie a si mesmo,
tome a sua cruz todos os dias e siga-Me.”
Lc 9, 23

TODOS

Este é um tempo de festas e de fins de etapas. Finais do ano escolar, com os exames a confirmar o trabalho de um ano e as notas a premiarem o esforço. Finais de ano pastoral com todas as festas da catequese, Baptismos e primeiras comunhões com sabor a tempo pascal. Há um cheirinho a férias (para os que as têm!), e o mar ou o campo a chamarem por nós. Descanso para uns, continuidade para outros, vivemos em ciclos, muitas vezes sem pensar mais fundo, nem questionar a engrenagem de tudo. É preciso ver para onde vamos e com quem vamos.
O ritmo da liturgia leva-nos a um momento fulcral da vida de Jesus com os discípulos. Para a etapa seguinte os amigos de Jesus precisam passar num exame. Saber se estão capazes do nível seguinte, de arriscar o jogo novo do “quem perde, ganha!”. Duas perguntas apenas, uma mais fácil e outra a valer maior cotação. A matéria para a primeira resposta estava na ponta da língua. Tinham ouvido os ditos de muitas pessoas, conheciam a esperança de Israel, sabiam bem o passado. A resposta à segunda pergunta é que foi mais difícil: Jesus era mais do que aquilo que se dizia, não tinham palavras para o descrever. Tinha traços do passado mas era mais futuro, e Pedro arrisca a resposta que compromete para algo novo. Jesus vai então revelar o seu “bilhete de identidade”, mesmo que eles não consigam ainda entendê-lo.
A teoria ficou gravada no coração deles: um messias sofredor, rejeitado, crucificado, morto e ressuscitado? Não estavam preparados para isto. Então Deus não é Todo-Poderoso, vencedor dos malvados, dominador do universo, sempre triunfador? E antes que despertassem do choque, Jesus fala a todos (os discípulos, outros que o ouviam, aos do seu tempo e de todos os tempos, nós inclusive), sobre o que implica “andar com Ele”, “segui-l’O”. S. Lucas é o único evangelista a dar importância ao “todos” a quem se dirige Jesus, e a sublinhar que a cruz é para levar “todos os dias”. Não há viver com Cristo de diferentes categorias. Ou seguimos ou não seguimos, ou vivemos ou não vivemos. Sem dúvida que a perfeição e o coração de cada um só Deus pode medir. Não é uma prova de velocidade para haver um vencedor, mas de resistência para nos auxiliarmos, e todos chegarmos.
O jogo do “quem perde, ganha” parece estúpido para as nossas contabilidades. Que ganho é esse que não vê imediatamente, que não se pode depositar num banco ou publicar numa rede social? O individualismo tem por prémio a solidão, a vida “selficada”; a vida feita dom multiplica-se, constrói comunhão. Ultrapassar o “salve-se quem puder” para viver a “salvar todos os que puder”, é a cruz de todos os dias. Cruz que é vida dada, e não roubada, nem acumulada, nem guardada. Se “todos” forem mais importantes do que “eu”, ou só “os meus”, ganhamos verdadeiramente a vida. E, então, não importará menos “para onde vamos”, pois sabemos “com Quem” vamos?
in Voz da Verdade, 23.06.2019
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SÍNODO DOS BISPOS
ASSEMBLEIA ESPECIAL PARA
A REGIÃO PAN-AMAZÔNICA
AMAZÔNIA
NOVOS CAMINHOS PARA A IGREJA
E PARA UMA ECOLOGIA INTEGRAL
DOCUMENTO
DE TRABALHO

Seguindo a proposta da Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM), o documento se estrutura com base nas três conversões às quais o Papa Francisco nos convida: a conversão pastoral, à qual nos chama por meio da Exortação Apostólica Evangelii gaudium (ver-ouvir); a conversão ecológica, por meio da Encíclica Laudato si’, que orienta o rumo (julgar-agir); e a conversão à sinodalidade eclesial, mediante a Constituição Apostólica Episcopalis Communio, que estrutura o caminhar juntos (julgar-agir).
Instrumentum Laboris é fruto de um longo processo que inclui a redação do Documento Preparatório para o Sínodo, em junho de 2018, e uma ampla escuta às comunidades amazônicas. A evangelização na América Latina foi um dom.
Apesar da conquista militar e política, e para além da ganância e ambição dos conquistadores, houve muitos missionários que partilharam sua vida para transmitir o Evangelho.
Frequentemente o anúncio de Cristo se realizou em conivência com os poderes que exploravam os recursos e oprimiam as populações.
Hoje em dia, a Igreja tem a oportunidade histórica de diferenciar-se claramente das novas potências colonizadoras escutando os povos amazónicos para exercer com transparência seu papel profético.

Pidamos ante todo al Espíritu Santo para los padres sinodales
el don de la escucha, escucha de Dios,
hasta escuchar con Él el clamor del pueblo, escucha del pueblo,
hasta respirar en él la voluntad a la que Dios nos llama.
Constitución Apostólica Episcopalis Communio, Francisco, 2018.

I: A VOZ DA AMAZÔNIA ..................................5
II: ECOLOGIA INTEGRAL,
O clamor da terra e dos pobres .......................15
III: IGREJA PROFÉTICA NA AMAZÔNIA:
Desafios e esperança ......................................37

A VOZ DA AMAZÔNIA
O rio não nos separa, nos une,
nos ajuda a conviver entre diferentes culturas e línguas
1 - VIDA............................................................................8
2-  TERRITÓRIO ……………………………………………………………………….11
3 – TEMPO KAIRÓS.............................................................13
4 – DIÁLOGO………………………………..........................................14

VIDA
“(Hoje se) exige que anunciemos Jesus Cristo e a Boa Nova do Reino de Deus, denunciemos as situações de pecado, as estruturas de morte, a violência e as injustiças internas e externas e fomentemos o diálogo intercultural, inter-religioso e ecumênico.”
(DAp, 95)..

O Rio Amazonas é como uma artéria do continente e do mundo, flui como veias da flora e da fauna do território, como manancial de seus povos, de suas culturas e de suas expressões espirituais.
A bacia do Rio Amazonas e os bosques tropicais que a circundam nutrem os solose regulam, por meio da reciclagem de precipitação, os ciclos da água, energia e carbono em nível planetário. O Rio Amazonas joga a cada ano no Oceano Atlântico 15% do total de água doce do planeta. A Amazônia é essencial para a distribuição das chuvas em outras regiões remotas da América do Sul e contribui com os grandes movimentos de ar ao redor do planeta. Mas, segundo alguns especialistas internacionais, a Amazônia é a segunda área mais vulnerável do planeta em relação à mudança climática provocada pelos seres humanos.
O território da Amazônia compreende parte do Brasil, Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Venezuela, Guiana, Suriname e Guiana Francesa em uma extensão de 7,8 milhões de quilômetros quadrados. Os bosques amazónicos cobrem 5,3 milhões de quilômetros quadrados, 40% do bosque tropical global. A Amazônia abriga entre 10 e 15% da biodiversidade terrestre.

O Bem Viver
A busca dos povos indígenas amazônicos pela vida em abundância se concretiza no que eles chamam de Bem Viver. É viver em harmonia consigo mesmo, com a natureza, com os seres humanos e com o ser supremo. Esta compreensão da vida se caracteriza pela harmonia de relações entre a água, o território e a natureza, a vida comunitária e a cultura, Deus e as diversas forças espirituais. Estes povos falam da vida como um caminho rumo à Terra Sem Males ou em busca do Monte Santo.
Na Amazônia se sofre pela violação dos direitos dos povos originários, como o direito ao território, à autodeterminação, à demarcação dos territórios e à consulta e consentimento prévios.
A ameaça a este Bem Viver provém de interesses econômicos e políticos de setores dominantes de empresas extrativistas, com a permissividade – e muitas vezes a conivência – dos governos locais e nacionais. Na atualidade, desmatamento, incêndios, mudanças no uso do solo e contaminação estão levando a Amazônia a um ponto sem retorno. Aquecimento em torno de 4 graus centígrados e 40% de desmatamento conduzirão à desertificação da Amazônia, e é preocupante que hoje em dia já estejamos entre 15 e 20% de desmatamento.
Defender a vida
Vida implica a defesa do território, de seus recursos ou bens naturais, a cultura dos povos e suas organizações, seus direitos e a possibilidade de serem escutados.
O Bem Viver implica uma comunhão com a natureza e uma integração com a história e o futuro. A destruição da Bacia Pan-Amazônica gera um desequilíbrio do território local e global. Isso afeta a reprodução da fauna e da flora e a produção, o acesso e a qualidade dos alimentos.
O cuidado com a vida supõe confrontar uma visão insaciável do crescimento sem limites, a idolatria do dinheiro, uma cultura de morte. A defesa da megadiversidade cultural da Amazônia é algo que não está resolvido no âmbito pastoral.
Somos parte da natureza.
Somos água, ar e terra, vida criada por Deus.
A Mãe Terra tem sangue e está sangrando,
muitas multinacionais cortaram-lhe as veias.

O território amazônico é um lugar teológico a partir do qual se vive a fé, uma fonte de revelação de Deus, um lugar de sabedoria para o planeta, de onde Deus fala. Na Amazônia se manifestam as carícias do Deus que se encarna na história.
Um olhar contemplativo, atento e respeitoso para os irmãos e irmãs, e também  para a natureza, a irmã árvore, a irmã flor, as irmãs aves, os irmãos peixes e até para as irmãs pequenas como as formigas, as larvas, os fungos ou os insetos permite às comunidades amazônicas descobrir como tudo está conectado, valorizar cada criatura e ver a beleza de Deus revelando-se em todas elas.
O Papa Francisco, em Porto Maldonado, nos convida a defender esta região ameaçada, para preservá-la e restaurá-la para o bem de todos; ele nos dá esperança em nossas capacidades de construir o bem comum e a Casa Comum.
A Amazônia também é lugar de dor e violência. Há destruição ambiental, enfermidades e poluição de rios e terras, derrubada e queimada de árvores, perda massiva da biodiversidade, morte de espécies; tudo isso constitui uma crua realidade que nos interpela a todos e todas. O grito de dor da Amazônia é um eco do grito do povo escravizado no Egito e a quem Deus não abandona.

Este território não é nosso, não é meu, não é seu,
é da geração que vem depois.
Maritza Naforo, povo Huitoto

NOTA: Infelizmente não posso formatar as 60 páginas do documento, pq quando faço o copy paste este fica completamente desformatado, pelo que o envio em anexo.