Amigos e Amigas
Naturalmente, as reacções diante da canonização do Papa João Paulo II,
são as mais variadas.
João XXIII é, naturalmente, o Papa da minha vida: era jovem quando ele
foi eleito e, com a convocação do Concílio Vat II, foi ele que me foi acordando
para a problemática da urgência da reforma da Igreja.
Entrei no seminário, para Filosofia, em pleno concílio – 1964 – já com
Paulo VI, e encontrei uma atmosfera efervescente, tanto entre padres como
alunos, com destaque para os finalistas de teologia. Cresci, por isso, como
jovem estudante de teologia (no Seminário dos Olivais-Lisboa), e como jovem
padre ordenado na Páscoa de 1975 em Nampula em pleno processo de transição para
a Independência de Moçambique, sob o influxo desafiador e
reformante/aggiornante do Vat II.
Com o Bispo Vieira Pinto partilhei e aprendi a viver esse original
dinamismo respondendo, tanto no estertor do colonialismo como no tempo da
revolução marxista leninista, ou no tempo da guerra civil e dias de paz incerta
que se lhe seguiram.
Partilhei, no mais nuclear ambiente diocesano, a gestão das várias
facetas da Diocese de Nampula: pastorais e económicas.
No dinamismo das numerosas comunidades cristãs que surgiram por toda a
diocese no contexto das vicissitudes a que a
revolução moçambicana as submeteu,
inevitavelmente nos confrontámos com a exiguidade de presbíteros no
conjunto da diocese (éramos, apenas, cerca de 30 para mais de 2.000
comunidades, dos quais apenas 2 era moçambicanos). Para que as comunidades
pudessem crescer na normalidade da celebração regular da SANTA EUCARISTIA,
chegámos a admitir, em Nampula (e creio que também em Lichinga onde servia o
saudoso Bispo Luis Gonzaga Ferreira da Silva) a ordenação de alguns animadores
das comunidades já com provas dadas de zelo pastoral. Aquilo que chamamos de
viri probati. O meu Bispo Manuel insistiu com o Papa João Paulo II para que o
autorizasse nesse sentido. Porém, na última ou penúltima visita ad sacra
limina, durante um almoço, diz o Papa João Paulo II: “D. Manuel, sobre isso não
se fala mais”. Assim, com um autoritarismo inaceitável, o Papa João Paulo II
impunha o seu ponto de vista em completa falta de sintonia com o Bispo e os
povo cristão desta diocese.
Certamente que se compreenderá que lamento que o Papa Francisco tenha
embrulhado a festa da canonização do “Meu Papa João” com a do Papa João Paulo
II. Sem dúvida que acabou por esmorecer a exultação de quantos vivemos, há 50
anos, a inesperada jovialidade do ancião
Angelo Roncalli que lançou a nossa Igreja nos caminhos criativos do
semper reformanda atenta aos sinais dos tempos, sem medos e restrições,
confiante no Senhor Ressuscitado.
Este pronunciamento negativo a respeito do Papa João Paulo II não tem
nada a ver, obviamente, com a sua santidade pessoal. Erros todos os humanos
cometemos e os Papas não estão isentos. Não foi o Papa Pio X aquele que
defendeu a figura vertical da Igreja piramidal como Sociedade Perfeita onde os
baptizados mais não tinham do que obedecer submissamente, em tudo e em todas as
circunstâncias, ao clero? Claro que a limitação teológica do Papa Pio X nada
beliscou a sua santidade pessoal. Alias, tal convicção oficial reinante durante
séculos, não impediu que o Vaticano II progredisse para a formulação da Igreja
como (novo) Povo de Deus, onde, naturalmente, como bem sabemos, o clericalismo
continua a querer reafirmar-se e a preocupar o Papa Francisco.
Estas coisas são como as cerejas. Termino aqui.
Uma saudação pascal no Senhor que nos ressuscita!
Zé Luzia
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