Atrevo-me
a pensar que, não sendo europeu por ser latino-americano, nascido na Argentina
e tendo no sangue os sangues europeus da sua família emigrante, o Papa Francisco
alarga o mundo estabelecido. Na Europa, em Roma, no Vaticano, há regras
definidas nos modos de expressão, nas separações entre classes sociais, nas
fórmulas de cortesia, no tempo devido a cada ritual no espaço público,
confessional ou não. Não vou comentar aqui a revelação de personalidade já tão
amada, como todos os dias a vamos conhecendo. Nem enunciar os temas de reforma
que tanto nos fazem pensar, tão desejados na militância de quem espera uma
Igreja que cumpra a mensagem revolucionária de Jesus, de amor, de paz, de
inclusão.
Desculpem
a minha recorrente alusão ao Brasil e aos brasileiros, sempre tão versáteis nos
seus atos. Vou contar-vos o que aconteceu no passado dia 20 de janeiro, dia de
São Sebastião, padroeiro da Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro e
feriado de muita religiosidade e devoção. D. Orani Tempesta, 63 anos,
“anfitrião” e principal organizador das Jornadas da Juventude, monge cisterciense,
9º arcebispo de Belém do Pará, é arcebispo do Rio de Janeiro desde 2009. Quando
foi agora nomeado cardeal pelo Papa Francisco, D. Orani disse que esta nomeação
é uma graça divina e é mais responsabilidade na Igreja Católica.
No
dia de São Sebastião, a primeira missa foi às 5 horas da manhã na Igreja dos
Capuchinhos, dedicada ao padroeiro. Seguiram-se missas às 6,7,8,9, até à missa
solene, às dez horas, celebrada por D. Orani. Nos treze dias antes desta data, a
imagem de São Sebastião é peregrina, em trezena.
Em
Ramos, bairro de samba e religiosidade, na zona norte do Rio, estes
acontecimentos têm tradição. Fundado há 53 anos, na sua quadra, que é espaço
popular de festas, atabaques e bateria de escola de samba, o Cacique de Ramos
tem por símbolo a imagem do índio brasileiro. E a partir de agora, terá a
imagem de São Sebastião. No último dia da trezena de São Sebastião, coincidindo
com o Santo, Dom Orani visitou o Cacique, benzeu a quadra e deixou a promessa,
que vai cumprir. Depois almoçou feijoada, fez fotografias, recebeu presentes.
Bira,
o presidente do Cacique, falou: “É uma pessoa que ele é gente da gente. Ele é
povão como a gente e a sensibilidade e respeito que ele tem às pessoas é o que
ele vai mostrar aqui hoje. Essa dedicação que ele tem com a cultura que a gente
ama, que é o samba”.
D.
Orani falou: “O Papa tem insistido justamente para isso, para que a Igreja
tenha um diálogo com a sociedade, para que todo o mundo se sinta acolhido na
Igreja, sinta que o Evangelho é para todos. É que a Igreja transmita a alegria
do Evangelho e saia às ruas levando a alegria, levando a cura, levando a vida,
levando a paz.”
Sincretismo
religioso, as escadarias da Igreja do Bonfim deixaram de poder ser lavadas
pelas baianas, digníssimas mães de santo do candomblé, por ordem de Roma, sob
João Paulo II. Os brasileiros invocam Nossa Senhora da Conceição, Iemanjá
africana das águas salgadas, e Oxum, das águas doces.
D.
Orani cumpre os caminhos do Papa Francisco. O que pensará a nossa Conferência
Episcopal sobre estes acontecimentos? Serão folclore local? O que pensa o nosso
Patriarca D. Manuel? Que austera Europa é esta?
Sem comentários:
Enviar um comentário