Não me
custa admitir que nas Jornadas Mundiais da Juventude possa haver muito de
Woodstock católico, mas também é verdade que aqueles três milhões que estiveram
presentes no Rio saíram de lá, na sua grande maioria, mais felizes e mais
decididos ao combate pela paz, pela justiça e pela fraternidade. Embora a culpa
não seja dele, será igualmente necessário estar atento para o perigo real de o
encandeamento provocado pela figura de Francisco e até algum populismo e culto
da personalidade apagarem a lúcida e necessária capacidade crítica.
De qualquer
forma, em quatro meses, Francisco pôs em marcha uma revolução tranquila, mas
real, na Igreja, e a sua figura e mensagem estão a abrir espaços de esperança
num mundo globalizado, habitado por imensos perigos.
A viagem ao
Brasil foi um êxito. A sua mensagem foi, em primeiro lugar, ele próprio, na
simplicidade, na bondade, na imensa cordialidade, proximidade e empatia com as
pessoas, que quer ver autenticamente felizes. Para isso, foi deixando recados e
exigências para todos, à maneira de profeta livre e exigente, em voz
encantatória.
O programa
para a Igreja toda: "As Bem-aventuranças e o Evangelho de Mateus, no
capítulo 25 (parábola dos talentos e o Juízo Final). Não precisam de ler mais
nada." "A Igreja tem de reformar-se continuamente; se não, fica para
trás. Há coisas que serviam no século passado ou noutras épocas e agora já não
servem; então, é necessário reformá-las."
Aos jovens:
"Tendes o futuro, sois o futuro, sede protagonistas da mudança."
"Ide sem medo para servir", "destruir as barreiras do egoísmo,
da intolerância e do ódio e edificar um mundo novo".
Contra a
exclusão, proclamou a necessidade da luta pela dignidade de todos,
concretamente, para "os dois pólos da vida: os jovens e os anciãos".
Nesta civilização, é "tal o culto que se presta ao deus dinheiro que
estamos na presença de uma filosofia e de uma praxis de exclusão".
"Não se deixem excluir nem excluam."
Nas
favelas: "Ninguém pode permanecer indiferente perante as
desigualdades." "A medida da grandeza de uma sociedade é determinada
pela forma como trata quem está mais necessitado, quem não tem senão a sua
pobreza." "Porque somos irmãos, ninguém é descartável."
Aos
desesperados da droga: "A lepra dos nossos dias chama-se droga", mas
"não estais sós". "Não deixeis que vos roubem a esperança."
"Tu és o protagonista da subida, ninguém pode subir por ti." E atacou
os "negociantes de morte, que seguem a lógica do dinheiro e do poder a
todo o custo".
Aos
eclesiásticos: "Fazem falta bispos que amem a pobreza e não tenham
psicologia de príncipes." "Devem ser pastores, próximos das pessoas,
pais, irmãos, pacientes e misericordiosos." "Reina a cultura da
exclusão e do descartável." Que tenham a coragem de ir contra dois dogmas
da sociedade atual, "eficiência e pragmatismo", e "sair ao
encontro das periferias, que têm sede de Deus e não têm quem lho anuncie".
Devem ir à procura dos "afastados, que são os convidados vip".
Aos
políticos: condenou a corrupção e pediu-lhes que sejam humanos, que tenham
"sentido ético" e pratiquem o "diálogo, diálogo, diálogo".
É preciso "reabilitar a política", que deve estar ao serviço do bem
comum, que "evite o elitismo e erradique a pobreza".
Porque é
que tantos têm abandonado a Igreja, incluindo "aqueles que parece viverem
já sem Deus?" A Igreja "mostrou-se demasiado débil, demasiado afastada
das necessidades deles, demasiado fria, demasiado auto-referencial, prisioneira
da sua própria linguagem rígida". Talvez tenha tido "respostas para a
infância do homem, mas não para a sua idade adulta".
"Com a
Cruz, Jesus une-se ao silêncio das vítimas da violência, que já não podem
gritar; com a Cruz, Jesus une-se a tantos jovens que perderam a confiança nas
instituições políticas porque vêem egoísmo e corrupção, ou que perderam a fé na
Igreja, e até em Deus, por causa da incoerência dos cristãos e dos ministros do
Evangelho."
Padre Anselmo Borges
03.08.2013
in DN
Sem comentários:
Enviar um comentário